Por uma Permacultura morena e ecossocialista

Cresce, no Brasil, interesse por novos métodos de viver e produzir. Mas ainda é branco e pragmático. É hora novo passo: o de associar-se às periferias, às maiorias e às lógicas não-capitalistas

Acampamento Nova Palestina, do MTST, na Zona Sul de São Paulo

Acampamento do MTST, em S.Paulo. Teórico afirma: “organizar uma comunidade, trabalhar o conceito de biorregionalismo, a economia, as relações, a governança, a politização… aí está o grande desafio”

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Djalma Nery entrevista Thomas Enlazador

Se você não sabe o que é permacultura1, não se preocupe: isso não é um privilégio seu. Como grande parte das práticas e propostas do chamado ‘mundo alternativo’, esse conceito é praticamente desconhecido do grande público, circulando majoritariamente por entre círculos iniciáticos e por seus arredores imediatos. É fato que, com o passar dos anos – ainda que lentamente – cada vez mais pessoas tem tomado contato com a permacultura por meio de cursos, vídeos, palestras e espaços de difusão do conhecimento.

Uma observação rápida no perfil geral de seus principais promotores e entusiastas pode levar a uma confirmação da restritividade do conceito: homens, brancos, jovens, universitários, de classe média e classe média-alta. Esse é um fato que constato pela vivência pessoal e pela pesquisa de mestrado que venho desenvolvendo desde 2013 sobre a popularização da permacultura no Brasil, a ser defendida e publicada até o final de 2016.

Em fevereiro desse ano entrevistei o amigo e permacultor Thomas Enlazador, fundador do extinto Ecocentro Bicho-do-Mato e do IBC (Instituto Biorregional do Cerrado), entre diversos outros projetos. Com base nessa entrevista – e na importância que vejo em seu conteúdo – decidi redigir essa matéria para movimentar o tema.

Mais do que um punhado de técnicas, a permacultura apresenta um outro projeto de vida e de sociedade, integral e integrado, e que afeta todas as áreas da existência humana. Thomas lembra que não podemos nos restringir apenas aos seus aspectos técnicos, que muitos de nós já dominam:

fazer horta mandala e sanitário seco, qualquer um faz: você pega um PDF, bate a cabeça duas ou três vezes, mas faz. Fica profissional. Mas organizar uma comunidade, trabalhar o conceito de biorregionalismo, a economia, as relações, a governança, a institucionalização, a politização… aí é onde está o grande desafio, em especial do design social, sobre o qual venho me debruçando”.

Ele traça também um pouco da cronologia da permacultura brasileira, e faz sua crítica ao processo e à conjuntura:

A permacultura no Brasil já passou por vários momentos. Aquele momento inicial em que estava restrita a 4 institutos, depois uma segunda geração, uma terceira, uma quarta, quinta, acho que hoje já estamos indo pra sexta geração de permacultores nacionais, haja visto que a permacultura já vai fazer 25 anos, desde quando foi realizado o primeiro PDC2 nestas terras. A permacultura no Brasil carece de base social, de unidade em cooperação, confiança e estratégias conjuntas. (…) Um Brasil Permacultor precisa de PermaAtivistas. Articuladores Sociais da Permacultura, que farão o Eco para a popularização, visitação, integração, inclusão social e intercâmbios econômicos mais justos e cooperados em rede.

Latinizemos mais nossa permacultura, emancipemos politicamente nossos Ecoletivos e Organizações de Resistência e Defesa de Territórios. Por Gaia, por Nós e pelas Futuras Gerações. Chegamos ao limiar da transformação.

A permacultura enquanto conceito e movimento pode agir com maior postura e firmeza nos processos da construção política dos Estados, Nações, Municípios, Vilas, Bairros, Biorregiões, e nos espaços de controle e participação social. Neles podem e devem ser pautados as soluções propostas pela permacultura. A partir dessa incisão em instancias e articulações institucionais, abre-se o leque para implementarmos uma Cultura Politica Regenerativa, pautando a Permacultura como politica publica na co-criação de Planos Diretores, Saneamento, etc.

Trabalho por uma Permacultura Popular, Ecosocialista, Solidária, Cabocla e claro, com maior conexão espiritual com nossos ancestrais. Pela conexão com Pachamama, no respeito e na cura com as plantas de poder, no sacramento dos ritos e mitos, das intergerações e Biorregiões, de brancos, pardos, amarelos e negros, hippies e punks, de gays, trans e lésbicas, das nossas duas centenas de povos indígenas em franca ameaça, dos ribeirinhos, kalungas, mendigos e refugiados, dos favelados, dos atingidos por barragens, dos sírios, haitianos e ciganos… A Perma, Ecovilas e Práticas Sustentáveis ainda não estão acessíveis, e se encontram em universos econômicos elitizados. Os educandos de cursos de perma, moradores de ecovilas e afins são em geral, brancos, filhos de classes média e alta, com bom nível universitário. A maior concentração de iniciativas se encontra no Eixo Sul-Sudeste. São poucos negros, indígenas, pescadores, rendeiras, sem teto e sem terras. Estão ainda parcialmente excluídos, mas eles dariam uma base concreta na formação política e Ecossocialista da Permacultura Popular Libertária.

Não nos limitemos a criar tão somente um movimento de redução da nossa pegada ecológica, muito menos da permacultura como um fim, e sim um meio.

Engajamento na base social, formação política, ações diretas de desobediência civil não violenta, alianças politicas com campesinos, indígenas, comunidades tradicionais, que como a própria permacultura, estão (estamos) à margem do sistema. Sem essa postura, nos fechamos em uma “bolha de luz verde e pseudo-sustentável” que não emancipa comunidades e muito menos insere socialmente.

Enxerguemos para além do numero de painéis solares de nossos institutos ou ecovilas, dos basons e das bioconstruções, dos hectares de Safs e Selfies. Deveria assumir uma postura mais aguerrida. De ecovilas de refugiados, de sanitários secos na favelas, da agrofloresta nos sertões e rincões, embaixo da ponte com moradores de rua… E isso, acaba se refletindo no Brasil que vivemos hoje, pode ser perigoso se não nos posicionarmos. Não só para uma ditadura, como é o medo de alguns, mas para que se instale uma democracia de fachada, como já vivemos em alguns aspectos.

Estamos criando uma tendencia a uma elite de comunidades sustentáveis ambientalmente, e despolitizadas socioeconomicamente? Grande parte dos projetos no Brasil, incluindo as próprias ecovilas, acabam tendo posturas que refletem a postura de uma cidadão que se alheia a politica e se ocupa na construção do seu bem estar social e zona de conforto. Uma desprezo pela politica, mas uma visão de conformismo com o Capitalismo que acaba os encubando. Um arquétipo coxinha, só que com um recheio mais sustentável. Ao invés de ser uma coxinha de frango é uma coxinha de jaca. Ótimo! Que bom que é sustentável, que bom que é ecológico. Celebremos que ocupam esse espaço, e que indivíduos compromissados estão fazendo esse movimento ligado à sustentabilidade. Porém isso não basta! Se não houver emancipação e formação política da conjuntura biorregional, nacional e global das esferas socioeconômicas, ambientais e política, sem a busca pela unidade na construção de um Brasil EcoSocialista, Solidário e Diverso, continuaremos a permaculturar de nós pra nós mesmos”

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Thomas ressalta também que, dentro das iniciativas

“(…) existem várias exceções. Várias não, algumas, que estão buscando levar a permacultura pros assentamentos do Movimento dos Sem Terra; pra produtores rurais; pro movimento mais campesino; para o Movimento dos Sem Teto, etc. Eu acho que a permacultura no Brasil precisa se voltar mais para os movimentos sociais e para as comunidades tradicionais, democratizar mais esses cursos, viabilizá-los financeiramente, e não transferir o custo dos cursos somente para as inscrições”.

Por fim, reconhece também

“(…) que a permacultura está começando a dar um salto no sentido de ser um pouco mais conhecida no Brasil. A gente ainda tem um abismo muito grande – institutos que cobram 2.500, 3.000 reais em um PDC, colocando-se como o melhor PDC do Brasil. Eu acho que a gente tem que sair um pouco dessa disputa, desse jogo de ego da permacultura. Eu acho que o momento agora é da permacultura se emancipar enquanto movimento, e trazer mais pra dentro esses permacultores antigos que não estavam muito conscientes da importância política da permacultura.”

É interessante citar que muitas pessoas justificam sua atração pela permacultura em seu caráter prático. Mais do que ‘falar’ de mudança, permacultura ‘é mudança em si’. Temos aí já um interessante salto qualitativo do discurso à ação, ainda que individual ou localizada. O que parece estar se anunciando nas discussões cada vez mais presentes no interior da ‘comunidade permacultural’ brasileira e mundial, é a proposta de um novo salto, onde, reconhecidos os limites da atuação local e individualizada, parte-se agora para uma articulação regional e global, na busca da ação e da prática comum balizada pelos princípios éticos da permacultura, pois o coletivo é sempre mais forte que o indivíduo.

No entanto, para esse salto, é indispensável difundir e popularizar cada vez mais esta proposta de transformação. Para além da constituição de uma rede de comunidades alternativas, o que se discute é tornar possível uma alternativa social ampla e inclusiva. E para isso, torna-se clara a necessidade de acessar a fração majoritária da população, composta pelas camadas sociais mais vulneráveis e excluídas.

Não se trata de convencer ninguém. Não é necessário converter pessoas, e nem é preciso uma maioria absoluta. Se for possível romper ao menos a zona do privilégio e do silêncio, e caminhar lado a lado com os movimentos sociais populares, urbanos e rurais, empoderá-los e ser por eles empoderada, a permacultura brasileira certamente se aproximará de seu objetivo de transformação social concreto e objetivo, aqui e agora.

Muito trabalho a ser feito; muita reflexão e mudança, sempre! O que vem depois da coxinha de jaca?

1 Para saber mais sobre esse conceito, acesse https://biowit.files.wordpress.com/2010/11/livreto-permacultura-1.pdf

2 Sigla para ‘Permaculture Design Course’, ou Curso de Design em Permacultura: considerado por muitos a ‘porta de entrada’ para este universo. Possui um currículo básico que aborda todos os rudimentos e princípios centrais em, no mínimo 72h de curso.

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20 comentários para "Por uma Permacultura morena e ecossocialista"

  1. Peter Cezar do Nascimento disse:

    Dentro deste cenário de segregação, penso que exista uma resistência de parte dos “excluídos” da permacultura nesta quinta ou sexta onda. Observo no meu lugar que – principalmente os jovens – as pessoas das comunidades tradicionais quilombolas não estão interssadas em se inserir nas coisas que por aqui eu e outros colegas tentamos promover.

    Parece-me que as pessoas desacreditam em possibilidades que não sejam as convencionais e não se interessam em ter uma postura de troca, muito menos de contribuição. Somente entram se tem um projeto que os financie em algo. Na essência me parece que se encontram em uma postura de “tomadores” e, só jogam o jogo se tiram dali algum benefício.

    Estou na pegada da mobilização social há mais de 10 anos e atualmente não me sinto muito á vontade em ficar “puxando pela mão” as pessoas e acabo por desacreditar um pouco nesta permacultura social. Neste contexto, existe o viés da segregação racial, mas também existe medo e preguiça, onde as comunidades tradicionais não se interessam pelo envolvimento que a permacultura trás. Assim como eles, sou negro, cafuzo, amarelo, pardo mameluco e ainda sim, considerado branco por não manifestar na pele a minha negritude. Entretanto, preferi não ficar reclamando e fui atrás de oportunidades.

    Se tem a mão que dá deveria existir a mão que recebe, se não tem a mão que recebe, não faz sentido a mão que dá, penso.

  2. Wow! Grato pela clareza, João Lucas Carvalho Neves! A permacultura, para mim, é uma questão de consciência que floresce…. uma mudança de paradigma que não se impõe…nasce do exemplo prático e da paciência! Não se trata de uma bandeira segregadora de classe a ser hasteada!

  3. Wow! Grato pela clareza, João Lucas Carvalho Neves! A permacultura, para mim, é uma questão de consciência que floresce…. uma mudança de paradigma que não se impõe…nasce do exemplo prático e da paciência! Não se trata de uma bandeira segregadora de classe a ser hasteada!

  4. Marcia Mar disse:

    Olá! Meu nome é Marcia e moro em Brasília. Compartilho desse pensamento, dessa visão que me trás a confirmação de que caminho no sentido correto!
    Minha intensao é levar aos periféricos a prática filosófica das terapias integrativas e medicinas alternativas e permaculturais

  5. Djalma, essa observação rápida no perfil geral dos principais “promotores” e entusiastas, realmente pode levar a um grupo de pessoas de perfis parecidos, mas isso não seria óbvio!? Essas pessoas brancas, homens (conheço mais mulheres permacultoras do que homens, deve ser coincidência) universitários de classe média, etc. são pessoas que hoje tem o acesso a informação, e possuem mais possibilidades de acesso, esse tipo de dado, é redundante, não acha!?
    Apesar de que o SAF ao meu ver esteja bem difundido sim, por pessoas relacionadas a essa área.
    Mas a questão aqui é o perigo da imposição, eu acho válido e necessário essa discussão, mas esse tom, impositor, questionador, me faz lembrar políticos, bons de papo…mesmo querendo movimentar o tema, temos que usar da consciência que nos cabe, pois esse movimento que você quis dar, pode ser tanto pra frente quanto pra trás.
    Thomaz está correto quando diz que trabalhar o conceito é muito mais importante (e mais desafiador, também) do que apenas, a aplicação de técnicas, mas quando se fala em PermaAtivistas, será que já não estamos nos colocando em uma bancada no congresso, ou ainda, criando um partido, ou uma rede, ou seja lá o nome que isso tenha!?
    Será que os permacultores, de 10, 15 ou 25 anos atrás queriam isso!?, (por isso não o fizeram) ou esse desejo é da nova geração!? Latinizar a permacultura…poxa, o termo é bonito, de verdade, mas a permacultura trabalha biomas, com princípios e éticas, não precisamos latinizá-la, concorda!?
    Gostei muito da provocação, mas devo dizer que não gostei do texto, quando senti (desculpe pelo “sentimento” ao lê-lo) que o discurso virava mais para o lado da política do que da ética e dos princípios que a permacultura prega, I – Cuidado com terra, II – Cuidado com as Pessoas, III – Partilha do excedente, exatamente nesta ordem, veja, que os princípios não latinizam, apenas estão aí para serem seguidos, respeitados e se possíveis mantidos em qualquer ação, seja ela, saf, bioconstrução, encontros, mutirões, etc é isso que deve ser pregado.
    O teu texto já cria um sentimento de certo ou errado, se você não é A, então automaticamente você é B, pratico a permacultura a 8 anos, e se tem uma coisa que me faz permanecer aí sim, ATIVO com esta maneira de enxergar o mundo, é isso, não precisamos tomar “partido”, apenas respeitar seus princípios e reforçar a sua ética. No seu dia-a-dia, e passa-las aos teus, como herança.
    “Trabalho por uma Permacultura popular, Ecosocilista, solidária, cabloca,…” acho eu, humildemente que não é por aí, mesmo! Somos filhos da mãe Gaia, seres vivos, assim como qualquer outro ser vivo, nossa luta, (dos “homens”) é fazer com que consigamos conviver harmoniosamente entre nós e com os outros seres, simples assim, não cair na mesmas armadilhas criadas antes de cristo.
    A tua pesquisa é totalmente válida e interessante, mas não crie GPS’s de classes sociais, raças, nível de escolaridade, dentro da permacultura. se o rico vai falar de PDC para o pobre ou vice e versa, isso realmente não é o caso, o caso, são as pessoas enxergarem na permacultura como uma solução prática e praticá-la.
    Enfim, penso que não preciso falar do termo “coxinha de jaca”, para não ser redundante, mas duas coisas me fazem refletir sobre seu texto:
    Como estamos ávidos por mudanças, porém as mudanças não acontecem em uma única geração, a história mostra isso…e outra é a nossa visão míope (e eu me incluo nela) de enxergar na gestão pública, a principal ferramenta de mudança, acredito que não precisamos dela.
    Pratico a permacultura (ou tento) como uma formiga, ou uma abelha, sem leis, e ABNTs, sem partidos, sem congressos, e naturalmente atraio para perto de mim pessoas que fazem o mesmo, e no final…no final temos uma colônia e mel!
    Abraço!

  6. Djalma Nery disse:

    Olá a todos e todas! Fico muito feliz com o alcance da matéria e com todo o debate que está se seguindo em inúmeros fóruns e espaços físicos e virtuais sobre um tema que considero bastante relevante. A própria intensidade do debate é um grande indicativo de sua necessidade – muito por falar e refletir sobre o assunto. O importante é mantermos os diálogos fraternos e construtivos para avançarmos coletivamente.
    Aproveito o momento para trazer algumas indicações e convites:
    1) Criamos há algum tempo um grupo no facebook voltado à uma concepção mais social, popular e política da permacultura, ao qual todxs são bem vindos para entrar e participar dos debates:
    https://www.facebook.com/groups/328662347292090
    2) Como cito no texto, meu trabalho de mestrado com mapeamento de grupos de permacultura segue em andamento, e convido vocês a participarem e auxiliarem na divulgação desse trabalho, que busca apresentar uma síntese contemporânea, um panorama sobre a permacultura no Brasil:
    http://veracidade.eco.br/mapeamento-colaborativo-da-permacultura-no-brasil/
    3) Por último, deixo também a indicação para que conheçam o trabalho que venho desenvolvendo desde 2012, na Estação de Permacultura Urbana Veracidade, em São Carlos, da qual sou um dos fundadores:
    https://www.facebook.com/AVeracidade
    No mais agradeço novamente 😀
    Muito bom podermos dialogar! Um enorme abraço e sintam-se convidados para todos os espaços!

  7. Eliara Sandim disse:

    Foi a melhor experiência da minha vida, o meu primeiro PDC, paguei caro (se comparado a minha renda) mas acho que valeu cada centavo! Mas também acho e pretendo um dia, levar a permacultura para quem não pode pagar, tanto a teoria quanto a prática, é preciso difundí-la por amor ao que somos, ao nosso meio, por desejo de mudança, não transformá-la numa mercadoria como todas as outras coisas na nossa sociedade, ou ela perderá seu sentido, seu valor… Apesar de que eu acredito que sendo a permacultura só uma renovação de conhecimentos passados, ela nunca se descaracterizará… Enfim, só a recuperação dos valores ancestrais pode salvar nossa planeta e nossa sociedade!

  8. Henrique disse:

    A ideia é boa, mas o texto começa claramente racista e segregador de classes. Se quiser que a ideia “vingue”, precisa melhorar muito a forma de apresentá-la, senão pessoas boas perderão o interesse.

  9. Muito boa a entrevista. Toca no ponto central da questão: o distanciamento entre o político e o ecológico.
    Como no Brasil as coisas sempre andam de modo um tanto torto, como, por exemplo, o Partido Verde, cuja origem é progressista e anti-capitalista, no Brasil é o inverso: mantém um discurso “ecologicamente correto”, porém fazendo piruetas retóricas para que o capitalismo condiga com o sustentável. Marina Silva está aí como grande exemplar dessa espécie de discurso.
    A permacultura, assim como o indigenismo, a luta campesina, a luta urbana por teto e dignidade, todos têm o mesmo sentido em diferentes propósitos: fim da verticalização da sociedade.
    É sempre bom lembrar, embora, por vezes, pareça trivial dizer.

  10. Cristiano Hickel disse:

    Para a boa reflexão desse estudo, há uma variável importantíssima que deve ser levada em consideração: Desde que iniciou a fuga das pessoas do campo para a cidade (sim, foi uma fuga, literalmente), a pobreza aliada da ignorância tomaram lugar na roça – no Brasil. Foram e ainda são vários os mecanismos que levaram à essa situação. Por outro lado, os conhecimentos cada vez mais estão concentrados nas ou através das universidades nas grandes cidades. Um “fenômeno” que teve início muito recentemente é um movimento oposto ao êxodo rural, em que o jovem com poder aquisitivo e inserido na universidade (minorias, portanto) passou a retornar ao campo com outra proposta, munido do conhecimento adquirido na cidade.
    Foi justamente nessa brecha que a Permacultura se inseriu. Porém, cabe ressaltar, que nem tudo é permacultura. O termo “permacultura” se tornou uma expressão generalizada para designar, em muitos casos, o retorno aos conhecimentos antigos relacionados à vida no campo, à agricultura orgânica, à vida em paz com a natureza, etc. Sendo assim, cuidado ao generalizar julgamentos sobre “projetos de permacultura”, uma vez que a expressão pode estar sendo mal empregada (ex.: nem todo amido é Maizena!). Abraço.

  11. Ricardo Pires disse:

    Entrei aqui para ler o post quase que exclusivamente por achar a chamada superficial – aquela tática midiática que segrega enquanto critica a segregação – e me sinto na obrigação de, se não fazer uma crítica, pelo menos esboçar alguma defesa que pode até ser um tanto ingênua e apressada pelo calor do momento mas que vê a generalização como um grande mal desse post. Me enquadro em boa parte dos estereótipos citados – não sem uma sensação incômoda de que o estereótipo, aqui, aponta o culpado em vez de propor a reflexão sobre sua participação efetiva no contexto – mas o curioso é que, como entusiasta de muitas dessas “modas” como permacultura, safs (mas não selfies, obrigado), bioconstrução e supostos neologismos afins (entre aspas porque pra quem conhece a permacultura há quarenta anos esse movimento pode até parecer “moda”, de forma não muito diferente dos fãs do Nirvana que acham que a nova geração não pode usar camisetas com o rosto do Kurt estampado, ah, os velhos tempos…) eu sempre me senti um marginal, como se o choque de cultura que minha ignorância citadina sofreu desde que entrei num blog sobre “permacultura” nunca pudesse ser totalmente absorvido – eu teria que nascer de novo para “ser um permacultor” e nunca vi essa onda de acessibilidade que surgiu há alguns anos como elitismo, pelo contrário! Graças a essa onda de visibilidade (moda?) eu ampliei meus horizontes, seja lá que nome dêem a “cordwood”, “saf” ou “cob” onde esse conhecimento é empírico e não ativamente buscado e adquirido. Concordo absolutamente com a necessidade da (re)socialização de todas essas técnicas principalmente no meio urbano, mas acho no mínimo injusto dar esse ar de “apropriação cultural” a algo que se expande e, ao meu ver, (re)inclui em vez de segregar – eu e muitos que conheci no caminho somos a prova disso, sejamos nós brancos, negros, pobres, ricos…

  12. Luis Kinugawa disse:

    Estamos tentando, desde 2008, levar a Permacultura pra África…. tá difícil, mas um dia , conseguiremos !!!!! Precisamos de ajuda !!!
    http://institutoafricaviva.blogspot.com.br/p/videos.html

  13. Amanda disse:

    Parabéns pela texto e proposta. Permacultura de verdade é isso aí: SOCIAL, sem “gourmetização”.

  14. Pete disse:

    é um grande error tentar politizar a Permacultura ! Mostra uma Ignorância de seu propósito.

  15. Deus Carmo disse:

    É preciso sobretudo vencer preconceitos. A maioria da população tem vergonha de plantar um pé de tomate. Acham que produzir a própria comida é coisa de pobre. O pior é que o preconceito está arraigado que até os mais pobres tem vergonha de produzir o próprio alimento. Sem praticamente nenhum espaço produzo uma parte de minha alimentação de hortaliças.

  16. Leonardo Paiva disse:

    Excelente,meus parabéns.Para mim um curioso desse movimento cultural e provável permacultor,foi de extrema clareza.

  17. Ana Rita disse:

    Existe um outro ponto a ser visto, esse dar nome a essa modalidade de forma de se integrar a cultura da vida, permanecer construindo a nossa estadia de forma sustentável, ou seja, Permacultura, soa muito descarado, porque essa cultura é extremamente ancestral. Bioconstrução? Burkina Faso a milênios constroem dessa forma e não foi necessário nenhum australiano inventor do PDC bater na porta de África pra ensina-los ou trazer algo novo ao mundo, alias, que mundo estamos falando? Me soa como um recorte racial, social, ou seja, um mundo branco, elitizado, científico, e por ai vai. Permacultura não tem nada de novo, a não ser o nome, e também não tem nada de inovador silenciar ao trazer pro “mundo” cultura de povos ancestrais (pretos, indígenas, mais, incas e afins) vivências que já construíram essas estruturas sociais, muitos antes desses nomes/nomenclaturas. Reconheço na vivencia moderna, desses criadores do conceito, existe uma clareza de organização mais difusa ao contemporâneo, a perspectiva do mundo deles, como pessoas brancas e ricas, porém, por ser algo ancestral é no mínimo logico o reconhecendo da onde, de quem, veio a INSPIRAÇÃO para reformulação de uma vivencia antiga para esse conceito permacultural, e logo, iniciar esses pensamentos com o quê politico de transformação e trazer os olhares em conjunto para o desenvolvimento da Permacultura, no Brasil e Mundialmente. Seria o BÁSICO. Se não se iniciou desse jeito, já demonstra que nasceu falida mais uma vez, ainda estamos em tempo de desconstruir e realinhar a biodiversidade de vidas existem, de pretos, de brancos, índios, dando poder de falar e de reconhecimento de suas historias e tecnologias, e sair de novo da zona de conforto. Se estamos afim, de verdade, de mudar algo, vamos começar tendo empatia pela vivência de cada um. PELO AMOR!!!!

  18. Gostaria muito de poder entrar em contato com o autor deste artigo. Já fui «iniciado» na permacultura, sou professor, fotógrafo, pesquisador e tenho muito interesse em seu estudo de mestrado. Estou inclusive planejando um doutorado dedicado ao mesmo tema.
    Belo artigo. Tenho que dizer que a coxinha de jaca é uma delícia, apesar da associação. rs

  19. Rita Lama disse:

    Excelente artigo, obrigada. Em minha atividade lecionando arquitetura suatentavel, permacultura vem como uma das grandes solucoes – nao apenas do ponto de vista ambiental como tambem da saude.

  20. Edgar Rocha disse:

    Adorei o termo “coxinha de jaca”! Define tudo: a inserção de conceitos tão úteis e transformadores em algo circunscrito a um modismo classe-média, sem nenhum compromisso ou afinidade com a própria cultura, com o próprio país. Basta o negócio se popularizar pra cair de moda e virar “coisa de pobre”, como ir à Paris e encontrar o porteiro do prédio onde mora no saguão. A Danusa pira.
    Se olhassem à sua volta e vissem a real afinidade da cultura agrícola nacional com conceitos elencados no texto acima, esqueceriam rótulos e aceitariam se integrar à cultura nacional, mas não! Aceitam a mudança se esta for fruto de concepções formuladas fora do país.
    Como bom filho de mineiros, sempre comi verduras da horta de casa, com o requinte de certos produtos nacionais descobertos pelos coxinhas: a taioba, a serralha, o umbigo de banana, o almeirão roxo, a cambuquira… Tudo tão bom, tão trivial para a mesa da maioria dos brasileiros. Composteira pra mim é aquele buraco onde a gente enterra os restos de verdura. E as folhas de chá nunca faltam também na maioria das casas da periferia. Coisa de pobre, né? Mas, tudo bem. Não me impedindo de ter tudo isto só pra continuar sendo chique, não tem problema: vão ser permacultores. Ao menos até a próxima moda.

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