Webdoc dá um zoio no graffiti pelo mundo afora

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Produção interativa francesa disponível na internet mostra trabalho de oito artistas e coletivos de “street art” que dão vida a cidades tão diferentes quanto Bogotá e Cingapura e São Paulo 

“Andar por aí à procura de arte urbana é uma maneira de pensar a cidade em outros termos, de capturar sua energia… e sua realidade.”

Essa é a justificativa que um grupo de realizadores franceses encontrou para produzir um documentário interativo que acaba de ser lançado na internet: Défense d’afficher (que pode se traduzir livremente como Proibido pixar) é um trabalho coletivo: convidou oito diretores e lançar olhares sobre o que andam fazendo e pensando oito street artistas espalhados pelo mundo. É gente que vive em lugares tão distantes e diferentes quanto Bogotá e Atenas, mas que expressa ideias e visões de mundo nos espaços que mais abundam em qualquer metrópole contemporânea: o concreto das ruas.

“Explore o que a street art fala sobre o mundo”, convida a abertura do filme. Ao começar a exploração, vamos nos deparando com a capacidade da arte urbana em ser universal e particular ao mesmo tempo, na medida em que conserva características comuns em todo o mundo e também encontra criativamente um jeito de se expressar e contornar as dificuldades que se apresentam aqui, mas não ali. É uma dinâmica intensa de antropofagia e adaptação.

Como o próprio título sugere, todos os pequenos vídeos de Défense d’afficher fazem questão de falar sobre a repressão contra os artistas na rua. O acosso policial é mais ou menos intenso conforme pulamos de país para país — e o filme transmite essa disparidade.

Por isso, em Cingapura, onde fazer intervenções urbanas sem autorização implica em correr o risco de passar dois anos na cadeia, pagar multas de dois mil dólares e receber pelo menos oito chibatadas nas costas, o artista Trase One passou a olhar as sombras da cidade com outros olhos. Seu trabalho se explica à noite. Quando o sol se põe e as luzes se acendem, o espaço urbano se enche de claros e escuros. Trase One surfa na ausência — ou presença — de luz artificial para intervir minimamente e deixar seu recado.

Em Nairóbi, Bankslave dedica suas latinhas de spray a construir uma espécie de memorial para as vítimas que morreram durante um conflito étnico ocorrido na periferia da capital queniana. Num edifício destruído e abandonado desde a tragédia, o artista retrata a rotina da favela que cresce ao redor, o trem que passa no meio dos barracos, as crianças etc. Quando quer falar para maiores audiências, não hesita: vai para o centro da cidade e, em outros muros, para outros quenianos, com diferentes linguagens, imprime sua marca.

A crise do sistema financeiro — que estourou em 2008 e que para muitos é também uma crise do capitalismo — se reflete na obra do coletivo Beepers, que atua nas ruas de Atenas. Na Colômbia, a única mulher artista: Bastardilla não mostra seu rosto no vídeo, mas explica porque se dedica a pintar o universo feminino nos muros de Bogotá. Entre as tintas, um pouco de purpurina para brilhar durante a noite.

Já o parisiense Ludo profana os espaços publicitários que se espalham pela capital francesa. Não importa se estão nos pontos de ônibus ou outdoors. O artista produz seus próprios anúncios, reinterpretando e redesenhando marcas de roupa, joias ou perfumes que desembolsam fortunas para conquistar os corações e mentes das pessoas — e fazê-las comprar comprar comprar.

Se cada cidade tem sua tretas, em São Paulo, o diretor Pedro Watanabe registrou as andanças de dois artistas. Primeiro, Orion, que caminha pelas ruas da metrópole — não pelas calçadas, pelas ruas mesmo — carregando um balde de tinta branca que escorre, deixa rastros e forma poças. O artista pisa, as pessoas pisam, os carros passam por cima. Fazem suas próprias pegadas, suas próprias intervenções urbanas a partir daquela antes.

Depois é a vez do pixador Djan, também conhecido como Crypta, que aparece numa espécie de vídeo anexo. Djan vem de outra escola: muita gente dirá que rabisca as paredes, que suja os prédios. A legislação brasileira classificaria seu trabalho como crime ambiental. Djan fala das diferenças entre o grafiti e do pixo e explica porque, em sua visão, a pixação jamais será assimilada pelo gosto estético geral como foi o colorido do grafiti. Há controvérsias. Entre elas e por elas caminha o street art.

Défense d’afficher pode ser visto aqui. Boa viagem.

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