Washington perde soft power

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Cortes no orçamento golpeiam a “ajuda internacional” — que envolvia, quase sempre, contrapartidas indesejáveis

Os Estados Unidos estão a ponto de abrir mão de parte de seu poder de influência internacional. Nos cortes de investimentos públicos em debate na Câmara e Senado, informa reportagem de Steven Lee Myers, no New York Times, ambas as casas legislativas estão trabalhando com cortes profundos sobre o orçamento de 59 bilhões de dólares proposto pela Casa Branca para “ajuda internacional”. O valor deve cair para algo como US$ 47 bi (na versão dos senadores, em maioria do Partido Republicano) e 53 bi. O significado global é maior que o expresso pelos números. As verbas aumentarão muito no Iraque (onde a retirada militar dos EUA será compensada por outros programas); por isso, a queda no resto do mundo será bastante expressiva.

Entre outras ações, serão afetados o apoio a grupos “democráticos” nos países árabes que passam por reviravoltas (Tunísia e Egito, principalmente); o fornecimento de medicamentos e comida a regiões da África; o socorro diante de eventuais tragédias naturais (como as inundações no Paquistão). Os cortes estão sendo planejados apesar das declarações recentes declarações do presidente Barack Obama e da secretária de Estado, Hillary Clinton — que têm insistido na importância de os EUA exibirem ao mundo não apenas seu poder militar, mas também sua disposição para resolver problemas (o que alguns chamam de soft power).

A “ajuda internacional” tem sido alvo de amplo questionamento, entre os grupos e movimentos que lutam por uma repartição mais efetiva das riquezas globais. Não se critica apenas o papel dos EUA, mas as relações de subordinação que o mecanismo cria. Frisa-se que as doações de comida servem, algumas vezes, para inviabilizar (por dumping) a produção local, e abrir caminho para um fluxo permanente de exportações dos países ricos. Apresenta-se como alternativa a criação de impostos redistributivos internacionais.

Certos aspectos dos cortes agora em debate sugerem, porém, que as potências globais expõem seu lado pior quando restringem piores quando abrem mão do soft power.  No Senado, prevalecem até o momento posições que proíbem qualquer apoio financeiro a organizações que defendam o aborto, ou combatam doenças infecciosas fornecendo seringas descartáveis a dependentes de drogas. Pretende-se restringir as dotações à ONU, a seu Conselho de Direitos Humanos, ao Banco Mundial e à Organização Mundial da Saúde. Impõem-se condições à  ajuda aos países árabes. Corta-se sumariamente a transferência de recursos à Palestina, caso ela obtenha, na ONU, a condição de Estado-membro. Mas se mantém, livre de qualquer corte, a doação de 3 bilhões de dólares a Israel…

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