Evo Morales cede ao Tipnis

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Após reprimir os manifestantes, governo desiste definitivamente de construir estrada cruzando território indígena boliviano

Não haverá mais asfalto rasgando a Terra Indígena e Parque Nacional Isiboro Sécure (Tipnis), na Bolívia. O presidente Evo Morales anunciou na última sexta-feira (21) que desistia formal e definitivamente de levar adiante a construção do trecho 2 do projeto, que cruzaria o território dos povos yucararé, chimán e moxeño — e que enfrentava radical oposição por parte das comunidades locais. “Isso é governar obedecendo o povo”, declarou o líder aimará na tentativa de recuperar sua imagem e popularidade.

No dia 2 de outubro, Outras Palavras publicou uma longa reportagem sobre o impasse. Na ocasião, o governo havia acabado de autorizar uma violenta repressão aos indígenas do Tipnis, que marchavam até a capital, La Paz, para manifestar sua contrariedade à construção da estrada e exigir respeito à Constituição. Até então, Evo Morales vinha ignorando os pedidos de diálogo, os artigos constitucionais e os tratados internacionais que garantiam aos indígenas o direito de ser consultados previamente sobre qualquer projeto governamental que impactasse seu território, costumes e formas de vida. A violência empregada pela polícia contra a marcha chamou a atenção da opinião pública, provocou a saída de dois ministros e colocou o presidente numa situação delicada. Afinal, era um chefe de Estado indígena reprimindo indígenas; o homem que fala alta em defesa da Mãe Terra na tribuna da ONU, mas que estava ordenando a passagem de uma rodovia pela reserva natural.

O movimento cresceu, ganhou apoio da Confederação Obrera Boliviana (COB) e demais organizações independentes do campo e da cidade. Uma greve nacional de 24 horas foi decretada pelos sindicatos em solidariedade às vítimas da violência estatal. Os indígenas retomaram a marcha e chegaram a La Paz no dia 19 de outubro. Segundo o jornal argentino Página 12, cerca de 500 mil pessoas acompanhavam os 3 mil caminhantes quando irromperam pelas ruas da capital. Com tamanho apoio, os indígenas ocuparam a Praça Murillo, onde se localiza o Palacio Quemado, sede do governo. Ali permaneceram acampados até que Evo Morales decidisse recebê-los. Estavam munidos de uma carta de reivindicações com 16 pontos. A suspensão do trecho 2 da rodovia, que cruzaria o Tipnis, era apenas um deles — o principal. “Garanto que nenhuma estrada passará pelo território indígena”, disse o pesidente. “Portanto, o assunto está resolvido.”

Assim, Evo Morales desistiu não apenas do projeto original das obras, mas também de promover uma consulta pública nos departamentos de Beni e Cochabamba para que a população decidisse o traçado da estrada. Os deputados do Movimento Ao Socialismo (MAS) já estavam com o referendo pronto para a aprovação do presidente. O jornal cochabambino Los Tiempos informa que o governo brasileiro — que financia a construção da rodovia — felicitou a decisão. “É do nosso interesse que se encontre uma alternativa que acomode interesses políticos, desenvolvimentistas e ambientais”, disse o embaixador do Brasil na Bolívia, Macel Biato.

Em breve, a Assemblea Nacional deve aprovar a nova lei executiva. O texto declara que o Tipnis é “patrimônio sociocultural e natural, zona de preservação ecológica, reprodução histórica e hábitat dos povos indígenas chimán, yucararé e moxeño, cuja preservação e conservação são interesse primordial do Estado Plurinacional da Bolívia.”

O líder da Confederação de Povos Indígenas da Bolívia (Cidob) explicou a Dario Kenner, do blogue Bolivia Diary, que a relação dos manifestantes com Evo Morales mudou muito desde a repressão. E pra melhor. “Nós marchamos, nós sofremos. Tivemos uma recepção acolhedora da população de La Paz”, disse Adolfo Chávez Beyuma. “O governo precisa entender que os direitos coletivos devem ser defendidos tanto quanto os direitos individuais. Esses direitos estavam na Constituição e foram violados. Muito tempo teve que passar para que pudéssemos desenvolver uma proposta de trabalho conjunta com o governo.” —@tadeubreda

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Um comentario para "Evo Morales cede ao Tipnis"

  1. MARIO CAJUHY disse:

    É DESTA FORMA QUE O POVO DEVE AGIR. NÃO HÁ AUTORIDADE POLÍTICA OU POLICIAL , A AUTORIDADE MÁXIMA EM UM PAÍS É SEU POVO . OBEDEÇA-O OU RUA . MEU TOTAL APOIO AO POVO INDÍGENA BOLIVIANO .
    E UM CONSELHO : NÃO DURMAM COM OS OLHOS FECHADOS EM RELAÇÃO AO GOVERNO BRASILEIRO .

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