Guerra comercial: a China contra-ataca Trump

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Resposta cirúrgica de Pequim atinge estados agrícolas dos EUA e pode deixar presidente sem maioria parlamentar, em novembro. E há outras cartas na manga

Por Antonio Martins

Em 23 de março, com a grandiloquência usual, o presidente dos EUA, Donald Trump, anunciou o início de uma “guerra comercial” contra a China. Acusou Pequim de discriminar produtos norte-americanos. Impôs sobretaxas e limites a importações chinesas que, segundo assegurou, causariam prejuízo de US100 bilhões a seu concorrente. Este reagiu com extrema cautela. O ministério do Comércio chinês divulgou, dias depois, uma lista inicial de apenas 128 produtos norte-americanos sobretaxados. Seus valores mal somam US$ 3 bi. Mas uma reportagem publicada hoje no New York Times revela que a ação de Pequim pode ter sido extremamente cirúrgica — além de expansível no futuro.

O NYTimes viajou aos estados do meio-oeste norte-americano. Grandes produtores de cereais (em especial soja e milho), Iowa, Kansas, Minnesota, Indiana, Missouri e Dakota do Norte são, também, bastiões eleitorais do Partido Republicano. Foram, em especial, chave para sua vitória em 2016. Pesaram muito mais, segundo o jornal, que o rust belt o cinturão industrial degradado que também apoiou o atual presidente.

A reportagem revela um meio-oeste desolado. A sobretaxa de 25% sobre os cereais, imposta pelo governo chinês, pode arruinar milhares de agricultores. Pesará, em especial, sobre as eleições para a Câmara e Senado dos EUA, marcadas para novembro. O NYTimes crê: os fazendeiros prejudicados pela “guerra” que o próprio Trump abriu podem ser decisivos para tirar-lhe maioria legislativa em alguns meses.

E Pequim nem usou suas armas mais poderosas, lembra outra análise, agora do Centro para Estudos Internacionais Estratégicos, também norte-americano. A autora, Samm Sacks, relaciona um conjunto de medidas administrativas que os chineses poderão adotar em breve para ferir o setor de Tecnologia da Informação nos EUA. Nesse caso, o prejuízo político pode não ser alto – mas o econômico é astronômico.

A atitude de Trump, por fim, perturba economistas de repercussão internacional como Nouriel Roubini – quem primeiro previu a grande crise financeira de 2008. Nesta entrevista, ele adverte que atos como o do presidente norte-americano, num cenário instável como o atual, podem desencadear uma “guerra comercial em larga escala”. Segundo Roubini, seria extremamente danosa tanto para as grandes corporações como para o “livre” comércio – uma das pedras angulares do Consenso de Washington.

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