Um templo à música, à resistência e aos cinco sentidos

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João Donato, que fará o show de abertura em 16/3 (Foto: Cristina Granado)

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Surge em São Paulo “Tupi or not Tupi”, espaço para os sons, a culinária, os encontros — e para tramar, em meio à destruição do país, a retomada dos sonhos

Por Inês Castilho

Uma cidade com efervescência cultural só comparável à das grandes metrópoles do planeta. Um país com a riqueza musical extraordinária do Brasil. Foi para manifestar essa potência que se criou a Tupi or not Tupi, a nova casa de música de São Paulo. No matriarcado de Pindorama. No país da cobra grande.

A proposta envolve mobilização cultural. “É um espaço de resistência ao desmonte da cultura que a gente está vendo acontecer. Estamos vivendo uma situação de catástrofe econômica, política, cultural. O projeto não está ligado apenas a planilhas e racionalidade, mas envolve ousadia e coragem”, diz Angela Soares, mãe da ideia. “Foi realizado em tempo recorde, com enorme esforço — de trabalho e financeiro — de sócios, amgos, fornecedores, colaboradores, todos movidos por paixão.” Expressão mascarada de todos os individualismos, todos os coletivismos.

Tudo na casa — um casarão que por 16 anos abrigou a Oca Tupiniquim, primeiro bufê infantil com valorização da cultura brasileira — soa cuidado, delicadeza, excelência. Para proporcionar prazer não apenas auditivo, de escuta apurada, mas para alimentar os cinco sentidos – como sacou Guto Lacaz, criador do slogan e do logo da casa. “Um espaço colorido, afetivo, gostoso, com boa comida e boa bebida.” O espírito recusa-se a conceber o espírito sem o corpo.

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Alaíde Costa, na “Tupi” em 25/3

Os sócios têm estreita relação com a música, o que garante curadoria de qualidade. Fabio Tagliaferri é instrumentista, Jeanne de Castro é produtora, Marcos Barreto inventou a Casa da Banda e a empresária Angela Soares é a criadora da Oca Tupiniquim e da Oca Cultural. Daí o piano Kawai de meia cauda, de som excelente, o cuidado com a acústica: 184 painéis formando uma espécie de “abóbada” que cobre e envolve toda a área de shows, cerca de 200 m².

A programação musical vai de quarta a domingo. Às segundas e terças a casa vai abrigar cursos e workshops de música – composição, por exemplo – e sobre música. Vai ter também café, restaurante, uma pequena loja de CDs, camisetas, livros; uma galeria com fotos de músicos, shows, personagens; e um local para lançamento de livros. “Quem sabe o de Rita Lee?”, diz o produtor Marcos Barreto. Um ponto de encontro. Contra todas as catequeses.

E traz inovações. “Com o tempo pretendemos abrir os bastidores dos shows, que o público tem curiosidade de conhecer, e fazer passagens de som e ensaios abertos”, antecipa Marcos.

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Nadia Larcher, do grupo argentino Proyecto Pato, primeira atração internacional da casa (em 29/3)

As quartas estão reservadas a músicos jovens, em seu primeiro CD. Uma noite de revelações. “A ideia é mostrar sons novos, de excelente qualidade, que as pessoas ainda não descobriram. Como Breno Ruiz, com suas Cantilenas Brasileiras, a banda de jazz Silibrina e uma nova geração de excelentes cantoras.”

As quintas apresentam Convívio, programa do músico instrumental Arismar Espírito Santo e convidados. Já as sextas e sábados trarão música popular de qualidade – que Marcos prefere chamar de música autoral, com identidade e riqueza na execução. E não apenas brasileira. Uma programação mais variada, com artistas que são patrimônio cultural do país, como o pianista e compositor João Donato, as cantoras Alaíde Costa e Áurea Martins, e o maestro Laércio de Freitas, da velha guarda, ou os instrumentistas de jazz e choro Marco Pereira e Paulo Belinatti. Contra todos os importadores de consciência enlatada.

170311_Tupi or not Tupi - Luiz Tatit - Foto Gal Oppido

Luiz Tatit, a atração do dia 7/4 (Foto: Gal Oppido)

“A riqueza da música e dos músicos brasileiros, sua enorme criatividade merece ser pensada, repensada, vivida e revivida”, considera Angela. “Não estou nem falando dos 17 ritmos existentes só no Pará, mas da música regional do Norte, Nordeste, Sul”, emenda Marcos. Uma consciência participante, uma rítmica religiosa.

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O nome Tupi or not Tupi foi sugerido por uma adolescente, filha da Jeanne, quando estudava o Manifesto Antropófago de Oswald de Andrade, escrito em 1928 — de onde, aliás, foram extraídos as frases em negrito neste texto. Foi direto ao ponto, diz Angela: “A gente come, deglute, vive isso com intensidade e prazer”. A alegria é a prova dos nove.

A Tupi or not Tupi está em busca de apoio e patrocínio. “Se conseguirmos passagens aéreas e hospedagem, já dá para trazer músicos do Pará, por exemplo. Mais artistas, a preços mais acessíveis.”

Na visão de Marcos, cujo lado B é de economista, “a casa atrai um público interessante para marcas de tecnologia: Youtube, Facebook, Google. E para outras tantas que já demonstraram ter afinidade com a música, como a Natura e a Tim, por exemplo.”

Os ingressos dos shows têm faixas de preço que contemplam diferentes públicos – há espetáculos de 35, de 55 e de 75 reais. O serviço de comida e bebida, criado na mesma levada cultural tupiniquim, é feito apenas antes e depois do show. A carta de cachaças foi desenvolvida por Maurício Ayer, especialista na bebida brasileira e em literatura. O sommellier Elvis Campello selecionou vinhos e cervejas. Ambos criaram drinks especiais com nomes inspirados na música e cultura brasileiras À criativa chef Raphaela Homem de Melo coube criarum cardápio de culinária brasileira. Em comunicação com o solo.

Programação

De 16 de março a 08 de abril

16 de março, quinta, 21h30, João Donato e Arismar o Espírito Santo

17, sexta, 21h30, Ritchie & Blacktie

18, sábado, 21h30, Fabiana Cozza

22, quarta, 21h, Silibrina

23, quinta, 21h, “Arismar Convívio” com Léa Freire

24, sexta, 21h30, Lívia Nestrovski e Fred Ferreira

25, sábado, 21h30, Alaíde Costa e Laércio de Freitas

29, quarta, 21h, Nadia Larcher y Proyecto Pato (Argentina)

30, quinta, 21h, “Arismar Convívio” com Thiago Espírito Santo

31, sexta, 21h30, Renato Braz, com Áurea Martins e Alice Passos

1º de abril, sáb, 21h30, Renato Braz, com Áurea Martins e Alice Passos

5 de abril, quarta, 21h, Breno Ruiz

6, quinta, 21h, “Arismar Convívio” com Laércio de Freitas

7, sexta, 21h30, Luiz Tatit com participação de Marina Pittier

8, sábado, 21h30, Luiz Brasil Quinteto

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Um comentario para "Um templo à música, à resistência e aos cinco sentidos"

  1. Lérida Povoleri disse:

    Gostei muito da iniciativa e da programação.
    Parabéns e que vcs tenham muito sucesso, é o que mais desejo!

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