Para concretizar o direito à mobilidade noturna

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Como assegurar transporte público também na madrugada, quando as metrópoles estão vivas? Outras Palavras convida a participar de um debate de relevância nacional

Por Gabriela Leite

Uma petição virtual que pede ampliação do horário do metrô de São Paulo atingiu grande alcance nas redes sociais. Lançada há 20 dias, reuniu quase 83 mil assinaturas. Exige que o transporte subterrâneo funcione 24 horas, todos os dias, para atender aos trabalhadores noturnos, estudantes e a quem queira divertir-se à noite pela cidade. Coloca em foco, de maneira mais ampla, uma contradição de nossas metrópoles. Nelas, milhões de pessoas estão despertas de madrugada — mas têm mobilidade extremamente restrita. É possível superar tal limite, considerando dificuldades técnicas e financeiras? Outras Palavras passará a tratar deste tema e convida os leitores aportar informações e opiniões sobre ele.

Há, a princípio, três fatores a considerar: o direito; os obstáculos para efetivá-lo; as alternativas. Segundo alguns estudos, cerca de 15 milhões de brasileiros (um em cada sete integrantes da população economicamente ativa) trabalham entre 22h e 5h. Na maior parte de nossas metrópoles, o transporte público nestes horários é ou inexistente, ou muito rarefeito. Quem não tem carro, enfrenta longas esperas, preço alto do táxi, insegurança ou é, na maior parte das vezes, obrigado a adiar por horas a volta para casa.

O problema tornou-se mais complexo a partir da Lei Seca, que agora pune rigidamente quem consome qualquer quantidade de álcool e dirige. Ela já ajudou a diminuir os acidentes de carro, mas não criou alternativas para quem deseja ir a shows, festas e bares e quer regressar com rapidez e conforto.

É possível um metrô que funcione ininterruptamente? Para alguns engenheiros, não. Eles afirmam que o período da noite é essencial para a manutenção dos vagões e trilhos, necessária para a segurança e agilidade dos trens durante o dia. Olhando para as grandes cidades do mundo, percebe-se que talvez isso seja verdade, afinal a única cidade com um sistema de metrô que funciona sem parar é Nova York. Suas linhas são muito mais complexas do que as de São Paulo, mas ainda assim, todas as estações funcionam permanentemente. Existem também exemplos de funcionamento parcial — como o de Chicago, onde apenas duas linhas ficam abertas.

Quais as alternativas? Um projeto difundido por Gabriel Medina, candidato a vereador de São Paulo em 2012, sugere ônibus mais frequentes e seguros durante a noite. Segundo pesquisas da SPTrans, apesar de existirem algumas linhas noturnas na cidade (apenas 2,48% do total delas), o tempo médio de espera sobe para 50 minutos, entre as 2 e as 3 da manhã. Essa alternativa, menos ambiciosa e mais imediatamente viável que a do metrô, já se concretizou, em parte, em muitas outras cidades, como em diversas capitais europeias e mesmo em Campinas, onde existe sistemas de ônibus noturnos.

Os parágrafos acima apenas esboçam o problema. Queremos aprofundar, nos próximos dias, três aspectos: a) A radiografia do trabalho noturno, em São Paulo e outras grandes cidades brasileiras. Qual o perfil de quem o exerce. Como estas pessoas se deslocam. b) A situação, em detalhes, do metrô. A manutenção precisa ser feita todos os dias? Estende-se pelas cinco horas em que o serviço é interrompido? Poderia haver exceções, poupando, por exemplo, os fins de semana? c) Qual a real situação das linhas de ônibus noturnas? Quantas teriam de existir, para assegurar conforto e rapidez à população?

Dados concretos e pontos de vista sobre estes e outros temas serão muito bem-vindos. Para contribuir, basta comentar este post.

A economia noturna de São Paulo é intensa, com uma grande quantidade de bares, casas noturnas e restaurantes que costumam se concentrar nas áreas mais centrais da cidade. Restringir o direito ao transporte público apenas no horário comercial — e mesmo assim cheio de falhas — é negar uma parte importante da cidade à população. É necessário procurar caminhos para que os cidadãos tenham maior acesso a uma vida noturna que faz fama na maior metrópole do país.

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4 comentários para "Para concretizar o direito à mobilidade noturna"

  1. Gabriela,
    moro em Salvador, cidade que tem como único sistema de transporte público o rodoviário.
    Essa questão sempre foi discutida e exaustivamente debatida entre meus amigos aqui, pois, diferente de outras cidades pelo Brasil, os Soteropolitanos não são setoriais (quem mora no bairro A frequenta o bairro A e assim por diante). Nós circulamos pela cidade inteira, e, com a uma onda de revitalização do Centro pelos próprios moradores, essa circulação ficou ainda maior. Isso sem mencionar os trabalhadores noturnos!
    Contudo, apesar disso, os ônibus param de circular às 0h. Saliente-se, ainda, que temos na capital baiana umas das tarifas de táxi mais caras do País.
    Apoio a Lei Seca e acho que, independente da pessoa ter ou não automóvel, os governos (municipais e/ou estaduais) devem disponibilizar meios de locomoção para a população, inclusive durante o período noturno.

  2. Ao SINFERP parece estranho que a ninguém ocorra a mesma reivindicação para os "suburbanos", isto é, para as pessoas que fazem uso dos trens da CPTM. Para essa população continua valendo a mesma situação cantada por Adoniran Barbosa, em seu clássico Trem das Onze.

  3. Uma coisa que já ajuda e me ajuda é a presença de uma linha noturna para a região onde moro. É a 2291-10 que faz o trajeto circular entre Pq. Dom Pedro e term. São Mateus passando pela praça da república. Este ônibus faz este trajeto passando de hora em hora. Isso realmente mudou um bocado a minha capacidade de estar pelo centro da cidade após as 00h quando o metrô fecha. O problema é que ele nem sempre passa no mesmo horário o que acaba por me fazer esperar durante uma hora até que o próximo passe. No meu caso que o pego geralmente no viaduto 9 de Julho ao lado do bar "Estadão", sempre movimentado dia e noite, não é muito problema em se tratando de segurança. Agora, para quem precisa pegá-lo em outros lugares mais ermos do centro é complicado. Sei que também existem outras linhas noturnas que passam pelo mesmo lugar: uma para Cid. tiradentes e outra Cohab II que seguem o mesmo padrão de tempo.

  4. Antonio Celso Pinheiro Arquiteto disse:

    Acredito que esse debate deva existir e se buscar um caminho. Uma questão relevante é a SEGURANÇA. Como garantir a segurança das pessoas e dos veículos, seja metrô ou ônibus??

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