A China ataca os EUA: como a ciberguerra está se expandindo

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Vasta operação, desencadeada em Xangai, teria recolhido de segredos industriais a informações sobre redes elétricas e gasodutos. Washington bebe seu próprio veneno

Por Antonio Martins

“Sabemos que outros países e companhias roubam nossos segredos corporativos. Agora, nossos inimigos querem tornar-se capazes de sabotar nossas redes elétricas, instituições financeiras e sistemas de controle de tráfico aéreo”. Graves, as frases são do  último discurso “sobre o estado da União”, pronunciado por Barack Obama em 12/2. Por trás dele, está uma descoberta. Após anos de investigação, a Mandiant, uma companhia especializada em segurança de redes, teria identificado [relatório] uma sequência de ações de espionagem e captura de dados, desencadeadas, via internet, contra empresas e órgãos de governo norte-americanos. Teria concluído, também, que a base dos ataques é uma discreta unidade do Exército de Libertação Popular (ELP) nos subúrbios de Xangai. Por serem os pioneiros globais em ciberguerras e pela relação especial que mantêm com a China, os EUA evitam tratar o tema com alarde. Mas provavelmente já estão reagindo, o que amplia as ameaças de militarização do ciberespaço.As descobertas e suas repercussões estão sendo relatadas, desde segunda-feira passada, numa série de reportagens (1 2 3) do New York Times. Contratada por corporações norte-americanas, a Mandiant constatou ataques a 141 alvos, desde 2006. No início, foram espionadas pesquisas tecnológicas, processos de manufatura, estratégias de negociação. Em 2009, por exemplo, uma invasão dos computadores da Coca-Cola teria coincidido com o fracasso na tentativa de adquirir a Huiyuan, gigante chinesa na produção de sucos de frutas. Além disso, foram alvo, sempre segundo a Mandian empresas de terceirização de serviços militares e dos ramos químico, de mineração, satélites e telecomunicações. Mais recentemente, o chineses teriam se voltado para a busca de informações sobre sistema elétrico, gasodutos, abastecimento de água e de gás.

Os ataques são sutis e nunca diretos. Numa busca de dados que teve como alvo o próprio New York Times, os hackers teriam se servido das redes de universidades norte-americanas. As duas ferramentas principais usadas para iniciar a invasão são emails (“em inglês perfeito”, segundo o jornal) com links falsos e códigos maliciosos implantados, sob aparência de comentários, em páginas web. Após um longo trabalho de rastreamento, teria sido possível chegar ao foco de onde as ações foram desfechadas: um edifício de 12 andares, onde está instalada a Unidade 61.638 do ELP chinês (na foto abaixo).

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A embaixada chinesa em Washington negou, como era de prever, as informações — lembrando que em seu país a ação de hackers é proibida por lei… Mas também os Estados Unidos parecem relutantes em adotar uma atitude de confronto (o próprio Obama evitou fazer qualquer referência à China), por dois motivos.

O primeiro é o pioneirismo dos Estados Unidos nas difusão da ciberguerra e em suas versões mais agressivas. Desde 2008, Washington colabora com Israel numa vasta operação contra o programa nuclear iraniano. Ela envolve ações de espionagem, que já resultaram no assassinato de pelo menos três cientistas e difusão de um cibervírus letal. Implantado por meio de um pen-drive nas unidades iranianas de ultracentrífugas, o Stuxnet identificou rapidamente seu alvo (os sensores que controlam a velocidade dos equipamentos). Iludiu os operadores, mantendo aparência de normalidade nos controles de segurança. Mas provocou a elevação absurda no ritmo de rotação das centrífugas, levando-as à auto-destruição.

Mais recentemente, segundo o próprio New York Times, Washington estaria desenvolvendo uma arma ainda mais poderosa: o vírus Flame. Quarenta vezes mais complexo que o Stuxnet, já estaria infectando computadores em diversos países do Oriente Médio — sendo o Irã, novamente, o mais infectado. Poderia ser também mais nocivo que o Sutxnet, pois teria a capacidade de ativar o microfone interno do computador atingido para gravar todas as conversas, ou o bluetooth para se ligar a todos os aparelhos ao seu redor e obter números de telefone e senhas. Segundo um especialista da empresa de segurança eletrônica russa Kaspersky, o Flame “reescreve a definição de ciberguerra e ciberespionagem”.

O segundo motivo para discrição de Washington são os laços com Beijing. Ao contrário da antiga União Soviética, a China não pode ser tratada por “inimiga”, lembra David Sanger, o jornalista que acompanha o caso no New York Times. Os países mantêm comércio de 425 bilhões de dólares por ano e os chineses são os principais financiadores da dívida dos EUA. A delicadeza da relação foi reconhecida, em 2009, pela então secretária de Estado Hillary Clinton, em diálogo com o primeiro-ministro australiano. “Como você fala duro com seu banqueiro?”, perguntou ela, constrangida.

As guerras cibernéticas podem ser muito menos românticas do que sugerem os relatos sobre estratégias surpreendentes de invasão e defesa de computadores. Num mundo em que a vida quotidiana depende crescentemente de sistemas comandados pela rede, ela poderia resultar no colapso de serviços vitais, em áreas densamente povoadas; caos destrutivo; desorganização social maciça.

A iniciativa chinesa revela: como no caso dos drones, os EUA podem ter aberto um precedente cujos desdobramentos são incontroláveis e podem ter consequências profundamente desumanizadoras. Mais um motivo para compreender a fundo a nova ameaça e pensar caminhos para enfrentá-la.

 

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5 comentários para "A China ataca os EUA: como a ciberguerra está se expandindo"

  1. Caro Ricardo Arrais, naõ há erro no uso da palavra quotidiano. As duas palavras estão corretas e existem na língua portuguesa. Podemos utilizar as palavras cotidiano ou quotidiano sempre que quisermos referir os acontecimentos comuns que se sucedem todos os dias. A palavra cotidiano é a mais utilizada no português do Brasil enquanto a palavra quotidiano é a mais utilizada no português de Portugal.
    As palavras cotidiano e quotidiano têm sua origem na palavra em latim quotidianus. Em quotidiano manteve sua origem, em cotidiano sofreu evolução, ou seja, adequação ortográfica. Podem ser adjetivos (minha rotina cotidiana/ minha rotina quotidiana) ou substantivos comuns (meu cotidiano/meu quotidiano).
    Por outro lado, no texto de Antônio Martins, ao contrário de seu comentário não está escrito a palavra ''desdrição'' – tal palavra referendada por você está escrita corretamente – leia o trecho do texto de Martin: O segundo motivo para DISCRIÇÃO de Washington são os laços com Beijing.
    Por sua vez, está correto escrever que ''os EUA podem ter aberto um precedente''. Erro grotesco seria escrever ''os EUA pode ter aberto um precedente''. Abraços – MOUSINHO-GEÓGRAFO

  2. Ricardo Arrais, perdoe-me, mas o que você destacou de ''erros'' no texto do Antônio Martins não existe, pois, vejamos, a palavra ''DISCREÇÃO'' – grifo seu. No texto de Martins lê-se: ''O segundo motivo para discrição de Washington são os laços com Beijing. Portanto, se você leu assim, não foi neste texto. Outro você escreveu '' '' os EUA podem aberto um precedente''. No texto está escrito ''os EUA podem ter aberto um precedente'' – onde está o erro, pois erro seria escrever ''os EUA pode ter aberto um precedente'', aí sim, seria um erro grotesco. Mas não é o caso. Quanto a palavra quotidiano, leia isso:
    As duas palavras estão corretas e existem na língua portuguesa. Podemos utilizar as palavras cotidiano ou quotidiano sempre que quisermos referir os acontecimentos comuns que se sucedem todos os dias. A palavra cotidiano é a mais utilizada no português do Brasil enquanto a palavra quotidiano é a mais utilizada no português de Portugal.
    As palavras cotidiano e quotidiano têm sua origem na palavra em latim quotidianus. Em quotidiano manteve sua origem, em cotidiano sofreu evolução, ou seja, adequação ortográfica. Podem ser adjetivos (minha rotina cotidiana/ minha rotina quotidiana) ou substantivos comuns (meu cotidiano/meu quotidiano).
    abraços Mousinho – Geógrafo

  3. Caro Antonio Martins, o conteúdo é ótimo, mas deveria tomar mais cuidado com a forma, pois "discreção", "quotidiano" e "os EUA podem aberto um precedente" comprometem a leitura de quem preza a correção linguística e ortográfica…

  4. Não se pode pensar o mundo de hoje sem conhecê-lo…

  5. O deus, a Cibernética, em seu status quo anarquista, tece as correntes macificadoras da Humanidade!

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