Himba, o povo que existe na estética

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Uma das etnias da Namíbia destaca-se pelo impacto visual dos corpos rubros e seminus, do cuidado com cabelos “dread” e das roupas incomuns. Suas mulheres têm a mesma liberdade sexual dos homens

Por Flora Pereira e Natan de Aquino, do Projeto Afreaka

Das possíveis traduções do imaginário coletivo sobre as populações tradicionais africanas, os Himbas talvez seriam a mais perfeita. A estética do grupo deixa qualquer outsider de queixo caído e olhos viciados, sendo capaz de afetar até mesmo o menor dos curiosos. As mulheres, com suas peles avermelhadas vestidas em curtos pedaços de couro e enroladas em pelo menos uma dúzia de colares constituem sem dúvida a fascinação principal. São elas as principais responsáveis pela sobrevivência de uma cultura única em meio ao turbilhão da ocidentalização.

Na Namíbia, são oito as principais etnias, e assim como na grande maioria dos países africanos, elas se contorcem para preservar as tradições de seus precursores, mantendo vivas danças, festivais, hábitos de lá e hábitos de cá. No entanto, estão longe de viver – sobretudo na questão estética – como viviam há cem anos e não fossem um ou outro detalhe seria talvez impossível reconhecê-los ao piscar dos olhos. Com os Himbas é diferente, o impacto visual é instantâneo. Os corpos rubros seminus e os dreads do cabelo que parecem pegar fogo contrastam com qualquer cenário, urbano, rural ou selvagem.

A estética não é um assunto só para quem vem de fora. É também para eles, ou melhor, para elas, tema fundamental. Assim como as outras etnias, os Himbas também começam a se misturar com a vida ocidental. Muitos – se não a maioria – possuem celulares, rádios e outros itens comuns da era moderna. Alguns homens ainda levam tecidos amarrados às pernas ao invés de calças, mas de modo geral se vestem com jeans e camisetas normais, e se possível de times de futebol. Assim, são as mulheres, que através da cuidadosa e trabalhosa estética, carregam o fardo e o orgulho da resiliência de uma cultura.

“A nossa aparência é o que eu mais gosto do ‘ser Himba’, é com ela que podemos passar nossa história adiante. Quando alguém da vila vai para escola, sabemos que não voltará mais, não se vestirá mais assim. Isso (apontando vagarosamente para o penteado e para a pele) é importante para quem fica”, explicou uma senhora de uma das vilas da região de Opuwo, local de concentração da população Himba no país.

Para manter o visual, o empenho é grande. Pelo menos duas vezes por dia se besuntam com um creme colorado chamado por elas de otjize, que também serve como protetor solar, composto de manteiga e ocre esfarelado, argila de tom avermelhado. A manteiga é produzida com a gordura do leite da vaca diariamente ordenhada pelas mulheres. A roupa é confeccionada com couro de vaca e de cabra e também recebe as doses diárias de “tinta”. Os colares são feitos com galhos e folhas de árvores da região e não escapam da coloração.

O banho também segue padrões bem diferentes. Salvo para a bebida, desde que nasce a mulher Himba não deve ter contato com água – nem corpo, nem mãos, nem cabelos. E do mesmo modo, exalam um agradável perfume. Isso porque, também duas vezes por dia, elas tomam um belo banho de defumação, preparado com incenso e essências de ervas e folhas secas.

Já os homens se lavam com água, mas isso não significa para a sociedade nenhum tipo de vantagem que caracterize uma relação machista. “A sociedade é matriarcal”, explicou o documentarista espanhol Paco, que acompanha a sociedade há quase dois anos: “os homens se casam várias vezes, mas, mais por uma questão econômica. Dentro do casamento eu diria que a voz predominante é a da mulher. O respeito a elas é incrível e facilmente detectável”. A liberdade sexual também vale para os dois lados, as mulheres não se casam mais de uma vez, mas podem se relacionar com mais de um parceiro. E se engravidam fora do casamento, a criança é responsabilidade do marido e não do progenitor.

As himbas, de alarmante beleza, também trazem em seus penteados e adornos a representação do estado civil. A estética do arranjo também vale para os homens. Antes do casamento, o penteado do jovem é um moicano, que começa a ser elaborado assim que o cabelo da criança permite e é cortado e trocado por um chapéu acoplado ao resto do cabelo no dia do primeiro casamento. Já a moça solteira carrega os cabelos apostados para frente, quase que cobrindo o rosto. Quando casam, ganham um adorno de couro e os dreads são jogados para trás, tudo com destaque rubro do início ao fim. Os Himbas trazem um novo significado e um novo simbolismo ao vermelho. Além de cor, é psicologia, estética, cultura, tradição. Não é apenas vermelho, é Vermelho Himba.

Himbas from site AFREAKA on Vimeo.

 

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3 comentários para "Himba, o povo que existe na estética"

  1. Muito mesmo, e a cor da pele delas fica impressionante.

  2. Luz Ribeiro disse:

    Vamos pra lá? Eu vou.

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