Uma ameaça no Egito

Articulação entre militares no poder e Fraternidade Muçulmana poderia resultar em saída conservadora, e frustrar primavera árabe

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Por Robert Fisk, no The Independent | Tradução Vila Vudu

Revolução traída. O exército egípcio está em colusão com a odiada Fraternidade Muçulmana para trazer até vocês – ora… um novo Egito, muito parecido com o velho, desinfetado de Mubarak e de alguns (mas não todos) seus capangas, mas mantidos bem assegurados os privilégios do exército corrupto (residência, complexos, bancos etc.), em troca de permitir-se que alguns barbudos participem do governo. Corte e dispensa para os jovens revolucionários seculares que realmente lutaram na rua contra os assassinos da polícia secreta de Mubarak, para livrarem-se do ditador de 83 anos.

O quadro é sombrio – a Primavera Árabe converteu-se em eterno outono árabe. E pão e circo para os jovens egípcios que exigiram dignidade em troca de sua coragem: a imagem televisionada do velho leão infiel em sua jaula de ferro, amanhã, no centro de convenções do Cairo.

Sim, oferecido à juventude irada do Egito – e às famílias dos 850 mártires da revolução – o julgamento cenográfico (foto) do trio que comanda toda a imunda empresa, H. Mubarak & Filhos Ltda., todos na jaula que o presidente da empresa inventou para seus inimigos.

Um ex-ditador que se vai, ou uma revolução que se vai? As perspectivas não são boas. Os partidos jovens e seculares suspeitam de que amanhã será apresentada uma “abertura” do julgamento e, em seguida, o adiamento, por um ou dois meses, para que o ex-principal executivo da empresa morra em sua cama, no conforto de Sharm el Sheikh. “Mas o estamos julgando, exatamente como pediram” – dirá o exército. E voltarão às reuniões com a Fraternidade Muçulmana.

Não se trata só de o diretor do show ser o marechal de campo Tantawi, presidente do Superior Conselho Militar e amigo de Mubarak. Aqui, por exemplo, está o major-general Mohamed al-Assar, membro do Conselho Supremo, a contar ao Instituto da Paz dos EUA em Washington o quanto a Fraternidade amadureceu e tornou-se cooperante: “Dia a dia, a Fraternidade está mudando e adotando via mais moderada”, contou a eles. Claro que estão! Tomaram a Praça Tahrir semana passada, exigindo que a nova constituição egípcia seja baseada na Xaria. Mas Tantawi, al-Assar e o resto da brigada emedalhada nada farão para alcançar a mudança real em que insistem os revolucionários.

Em vez de destruir todo o sistema corrupto, os revolucionários receberão “reformas de dentro para fora”, além de alguns barbudos de meia-idade, cuja existência foi a verdadeira razão pela qual os EUA apoiaram Mubarak desde sempre. Mais tarde, claro, poderão ser convertidos em “grave ameaça” – tão logo o espírito do mubarakismo volte a reinar sem oposição.

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