Trump e a era da política sem ideia alguma

Wallerstein escreve: presidente dos EUA tem um único objetivo: manter-se no poder. A tragédia é que os “representantes do povo”, no mundo todo, pensam igual

Efeitos visuais em show de Roger Walters, em outubro de 2016

Efeitos visuais em show de Roger Walters, em outubro de 2016

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Paspalho e bruto, presidente dos EUA tem um único objetivo: manter-se no poder. A tragédia é que os “representantes do povo”, no mundo todo, pensam quase sempre do mesmo modo

Nos círculos familiares e de amigos pelos quais me movo, não acredito que haja alguém que votou em Donald Trump. Isso provavelmente também ocorre com a maior parte dos profissionais de classe média nos Estados Unidos. Além disso, um enorme percentual, entre estes gurupos, está obcecado com Trump e muito ansioso para que ele deixe de ser seu presidente.

Pedem-me com frequência que preveja por quanto tempo ele pode sobreviver no posto. Minha resposta padrão é: de dois dias a oito anos. Isso nunca satisfaz os interlocutores. Não podem acreditar que seja uma sentença séria. Os que fazem a pergunta veem Trump como uma pessoa “má” e acham difícil acreditar que esta visão não seja compartilhada, larga e crescentemente, pela maioria da população, incluindo os que votaram em Trump.

Para os que me questionam, parece ser uma questão de ideologia e ou moralidade. Se os outros não veem a realidade assim (pelo menos ainda), deve ser porque são mal ou insuficientemente informados sobre aquilo em que Trump acredita e como ele age. Pode-se tirar disso duas possíveis conclusões. A otimista é que a luz, ao final, iluminará os ignorantes e Trump será derrubado. A pessimita é que nada mais pode mudar as atitudes da maioria, e portanto não há esperanças.

Acredito que esta forma de enxergar o tema está muito errada. Trump não é um ideólogo. Sim, ele tem uma agenda que perseguirá com o máximo de sua habilidade. Mas a agenda é absolutamente secundária em relação a sua maior prioridade, que é permancer presidente dos Estados Unidos – uma posição que, para ele, equivale a ser o indivíduo mais poderoso do mundo. Ele fará qualquer coisa para permancer neste lugar – inclusive sacrificar qualquer parte de sua agenda, temporária ou permanentemente.

Ele tem extremo orgulho de ser presidente dos EUA. Como disse a um repóter, ele deve estar fazendo algo correto, já que é o presidente e o repórter, não. Ele considera-se validado por estar no posto. Busca aplausos nos outros e esbanja aplausos em si mesmo. Diz que é o melhor presidente que os Estados Unidos tiveram e provavelmente terão.

Mas por que digo que Trump permanecerá no posto de dois dias a oito anos? Porque ele não é o único cuja prioridade é manter-se no posto. Esta opção é partilhada por quase todos os membros do Congresso dos EUA. Há ao menos duas meneiras de remover um presidente: promover o impeachment ou invocar a 25ª emenda à Constituição, que trata da incapacidade de responder às tarefas da presidência.

O que levaria os membros do Congresso, e especialmente os do Partido Republicano, a buscar a remoção de Trump? Eles precisariam acreditar que manter-se no posto depende, em larga medida, de manter o mandato de Trump ou derrubá-lo.

A escolha é clara. O que não lhes parece claro até o momento é que opção os favorece mais. Por isso, oscilam e continuarão a fazê-lo por algum tempo. No momento, não veem vantagem em apoiar as pessoas (quase todas ligadas ao Partido Democrata) que exigem um processo para remover Trump.

Calcular a vantagem relativa das duas opções não é tarefa fácil. É, em grande medida, fazer uma leitura da opinião pública cambiante, algo de dificuldade notória. Os parlamentares leem as pesquisas (mas quais?). Encontram-se, em suas bases, com eleitores (mas quais?). Falam com seus financiadores (mas quais?).

Como em todas as situações relativamente bloqueadas, o bloqueio pode cair com um pequeno acontecimento, inteiramente inesperado, capaz de desencadear outros fatos e provocar, subitamente, uma corrida momentânea a surfar em nova maré. Isso pode ocorrer em dois dias ou nunca, até que Trump termine dois mandatos. É imprevisível. Não tem a ver com ideologia ou agenda. Tem a ver com permanecer no posto, em nome de permancer no posto.

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