Sobre Duas Rodas

Às vésperas do Dia Mundial sem Carros, nosso ensaio sugere: é hora de pensar no transporte coletivo, mas também nas bicicletas…

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No Dia Mundial sem Carros, nosso ensaio sugere: é hora de pensar no transporte coletivo, mas também nas bicicletas…

Por Diogo Nunes

Experimentar uma grande cidade enquanto ciclista foi uma das experiências mais marcantes de quando fiz intercâmbio, principalmente porque subverteu a noção padrão que eu carregava sobre mobilidade urbana, aquele senso comum de que transporte público é ônibus, metrô, trem e etc; e que andamos de bicicleta apenas por diletantismo. E quando esse transporte público é precário (como em Salvador e tantas outras cidades do Brasil), apelamos para o carro particular, que polui mais, ocupa mais espaço na rua e transporta menos gente.

Várias circunstâncias colaboram para que o uso da bicicleta não seja estimulado como alternativa para a mobilidade nas cidades brasileiras. Uma das mais fortes é o favorecimento histórico à indústria automobilística. Ele leva o motorista a acreditar piamente que a rua é dele – e a calçada, também. O brasileiro, desde criança, é “criado” para comprar um carro na primeira oportunidade. O sonho do carro particular é equivalente ao da casa própria e a desculpa para cada cidadão ter o seu é o transporte público que não funciona.

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Preferimos sofrer sozinhos, cada um em seu carro, presos no engarrafamento, ao padecer dentro de um coletivo lotado e sucateado. Com essa lógica entupimos as ruas com automóveis particulares e garantimos o faturamento bilionário de empreiteiras, fábricas de carros, indústria petroquímica e todas as outras iniciativas comerciais decorrentes da comercialização de carros.

O uso de bicicletas, apesar de preterido pelo poder publico, sempre foi a solução para pessoas que precisam se movimentar pela cidade para trabalhar, estudar, ter acesso a serviços públicos ou atividades de lazer, e não podem, ou não querem, pagar caro pelo transporte publico oferecido. Essas pessoas não têm outra alternativa de mobilidade e se arriscam nas ruas, disputando espaço com os carros, ônibus e motos, correndo sérios riscos, por causa de um mal que não provocam: o transito que é violento, estressante, barulhento e poluente.

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O cidadão que pedala no cotidiano, oriundo de qualquer camada social, merece, antes de qualquer coisa, um busto. Um monumento em sua homenagem, que louve e reverencie suas pedaladas, em agradecimento por deixar o ônibus mais vazio, o trânsito menos caótico e as cidades menos poluídas. Depois de eregido esse monumento, são necessárias medidas que viabilizem, estimulem e garantam a segurança do uso de bicicletas, para que os ciclistas-guerreiros que existem não sejam atropelados e para que haja novas pessoas aderindo a essa prática.

O poder publico precisa intervir para que o lado mais frágil na selva do transito seja protegido e essa intervenção está para além das leis que já existem e não são respeitadas. É preciso agir em duas frentes: primeiro, incentivar e priorizar o cidadão que optar pela bicicleta por meio de ciclovias, ciclofaixas, bicicletários, sinalização específica e integração aos outros tipos de transporte público. Por outro lado é necessário conscientizar e desestimular aqueles que escolheram sair de carro – lançando campanhas educacionais, fiscalização, cobrança de estacionamento, impostos sobre a aquisição de novos veículos particulares e combustível para esses veículos.

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Isso só será alcançado quando entendermos, enquanto sociedade, que não há cidade no mundo que se sustente sempre construindo viadutos e buscando soluções mirabolantes para enfrentar os problemas de mobilidade urbana. Grandes cidades, como Paris, Londres e Barcelona, já perceberam isso e estão tentando mudar a lógica dominante do automóvel, privilegiando o ciclista e o pedestre, para todos desfrutarem de um trânsito mais humano e uma população mais saudável. Na cidade catalã, por exemplo, é possível passar semanas sem usar o excelente transporte público da cidade, apenas pedalando. No entanto eles querem mais. O Massa Crítica é um evento mundial e lá ocorre mensalmente reunindo inúmeros ciclistas, que pedalam pelas ruas da cidade para tomar o espaço historicamente destinado aos carros!

Amsterdam é considerada a capital mundial do ciclismo e serviu de exemplo para a maioria das cidades que hoje querem mudar essa lógica. Talvez seja uma das pouquíssimas cidades onde o ciclista prevalece diante dos motoristas. Hoje a discussão lá é enfrentar os problemas decorrentes do grande número de ciclistas. Vejam só: faltam estacionamentos para as bicicletas, por exemplo. Percebam que qualquer medida para atenuar as consequências do excesso de ciclistas é mais barata, saudável, eficiente e viável do que direcionar a máquina pública para resolver os problemas que surgem por causa do uso automóveis.

Esse texto é um chamamento para que tenhamos um trânsito menos motorizado e mais humano; e o ensaio fotográfico é dedicado a essa cidade que vive, literalmente, sobre duas rodas.

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2 comentários para "Sobre Duas Rodas"

  1. Heloise disse:

    Otimo texto… é isso ai! vivo numa cidade ondo me desloco de bicicleta, meu filho de 11 anos vai pra escola de patinete e minha filha, de 16, usa o skate e a bicicleta também.. estive em Salvador em julho… fiquei sufocada com a poluição, os engarrafamentos e a violência simbolica e explicita de um trânsito caotico. Perdi um colega de infância, ha dez anos, atropelado em sampa quando voltava do trabalho de bicicleta… mais um guerreiro, como citado pelo autor. So que, infelizmente, ele não sobreviveu no caos urbano brasileiro.

  2. Hoje podemos falar de outro meio de transporte, mais leve ainda que as bicicletas: o skate. Ocupa menos espaço, voce o carrega sem problemas aonde quiser, nao demanda novas estruturas (estacionamentos), es muito duradoro o que significa muita mais economia e ainda,(vale a pena observar isto) gera um tipo de relaçoes muito amigáveis entre os usuarios.
    Vamos fazer uma reportagem sobre o tema?

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