Pelo futebol, mas contra o machismo e a violência

Começam a se multiplicar pelo país torcidas que vão aos estádios defender pautas políticas e sociais, enfrentando grupos truculentos e brutalidade policial

Por Lucas Faraldo, no Guerrilha GRR

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Começam a se multiplicar pelo país torcidas que vão aos estádios defender pautas políticas e sociais, enfrentando grupos truculentos e brutalidade policial

Por Lucas Faraldo, no Guerrilha GRR

Militância e futebol: assuntos cada vez mais próximos. Tanto em arquibancadas quanto em redes sociais, grupos de torcedores autointitulados antifascistas se reúnem Brasil afora para apoiar seus times e defender pautas políticas e sociais.

Na final do Campeonato Paulista, por exemplo, a torcida Palmeiras Antifascista se manifestou no Allianz Parque e pediu a redução do preço dos ingressos. Tais torcedores constantemente levam faixas ao estádio e protestam por diferentes causas antes e durante as partidas do Verdão.

O comportamento militante é similar ao da Ultras Resistência Coral, primeira torcida organizada antifascista do futebol brasileiro. O grupo de torcedores do Ferroviário (CE) foi criado em 2005, numa iniciativa de dois fãs do clube cearense: um anarquista, outro socialista.

– Nosso objetivo é, com teor politizado, atuar de forma a não reproduzir preconceitos da sociedade e a levar ideais anticapitalistas para dentro dos estádios – explicou Leonardo Carneiro, sociólogo, professor e integrante da Resistência Coral.

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Faixa da Resistência Coral

 

As pautas de torcidas antifascistas giram em torno do combate à opressão. Para tais torcedores, o futebol é um ambiente machista, homofóbico, racista e, nos últimos tempos, elitista. A intenção da Resistência Coral, da Palmeiras Antifascista e de outros grupos semelhantes é utilizar a modalidade para desconstruir pensamentos que afetem minorias.

– Estávamos num jogo no Pacaembu e vimos um palmeirense com um casaco de uma ultra fascista da Lazio. Percebemos que a torcida do Palmeiras tem muita gente que não é muito agradável de se ter em meio a uma torcida tão diversificada. Então surgiu a ideia – disse um dos criadores da Palmeiras Antifascista, que pediu para não ser identificado.

– A sociedade brasileira é muito conservadora. O futebol é reflexo disso, extremamente conservador. Parece andar mais devagar do que os outros ambientes. É muito importante o antifascismo como ideologia anti-intolerância ganhar força em todos os lugares para combater discursos de ódio e agressões a minorias – completou.

Inspiração para a Palmeiras Antifascista e pioneira nesse tipo de luta no futebol brasileiro, a Resistência Coral quer servir de exemplo para as demais torcidas defenderem pautas políticas. A lógica de Carneiro é simples: se torcedores do Ferroviário, clube sem grande popularidade e com jejum de títulos de 20 anos, conseguiram chamar atenção Brasil afora…

– Se nós, que somos de um clube nessa situação, geramos um impacto legal, fico imaginando o que aconteceria se surgisse essa mesma torcida num clube de massa, como Corinthians, Flamengo, o potencial que teria. Que isso aconteça e seja consolidado.

Vale lembrar que há grandes focos de torcidas antifascistas em outros clubes nacionais, como Vasco, São Paulo e Corinthians.

Represália

Durante conversa com a reportagem, nos arredores do Allianz Parque, minutos antes do início de um jogo, membros da Palmeiras Antifascista evitaram posar com bandeiras nas ruas. O motivo? Receio de ataques de torcedores adeptos do neonazismo. Em busca de proteção, o grupo costuma se reunir próximo a um bloqueio de trânsito feito pela Polícia Militar nas proximidades da rua Turiassu.

A polícia, por outro lado, também não é vista com bons olhos por movimentos antifascistas. Os próprios palmeirenses confessaram se sentir incomodados em caso de proximidade da PM. Leonardo Carneiro, da Resistência Coral, contou que, no Ceará, a preocupação dos torcedores com forças públicas de segurança é inclusive maior do que com ataques neonazistas.

– Movimentos fascistas aqui no Nordeste são mais diminutos comparados ao Sudeste, pela própria imigração europeia. Aqui também tem, mas eles não têm tanta força. As repressões que já sofremos foram da polícia, no sentido de restringir a presença de nossas faixas no estádio – disse o torcedor coral.

As faixas que já foram vetadas (e até danificadas) nos jogos do Ferroviário continham dizeres “Nem guerra entre torcidas e nem paz entre classes” e “Resistência palestina”. No caso da Palmeiras Antifascista, os membros escondem as faixas dentro de blusas e tênis para não serem barrados pela PM. Os torcedores afirmaram já ter ouvido de policiais que “futebol não é lugar para manifestação política”.

Inspiração

Fundado em 1910 na cidade alemã de Hamburgo, o St. Pauli ganhou notoriedade internacional a partir da década de 1980. Dentro de campo, o clube não tem muito do que se orgulhar, mas fora das quatro linhas…

No fim do século 20, os torcedores do St. Pauli se organizaram em lutas contra fascismo, racismo, homofobia, machismo e capitalismo. As até então inusitadas pautas da torcida foram encampadas pela agremiaçao, que além de já ter tido um homossexual assumido na presidência, também carrega em seu estatuto um posicionamento libertário e ideais antifascistas.

Vale destacar outro exemplo na Europa. Na Itália, berço do fascismo de Benito Mussolini, o conflito político ganha cores nas arquibancadas. Enquanto clubes como a Lazio têm em sua história fortes traços de racismo, homofobia e diversas outras opressões contra minorias, há equipes como o Livorno, cujos jogadores e torcedores assumem a posição de esquerda na política.

 

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