A vida secreta nos mega-armazéns da Amazon

Trabalhadores da gigante do varejo global relatam suas experiências: precariedade, jornadas exaustivas e chefes-tiranos por… um salário no final do mês

Por Paulo Nogueira, no Diário do Centro do Mundo

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Provocados por site norte-americano, trabalhadores da gigante do varejo global relatam suas experiências: precariedade, jornadas exaustivas e chefes-tiranos por… um salário no final do mês

Por Paulo Nogueira, no Diário do Centro do Mundo

A Amazon caminha para ser a nova rainha do comércio on-line no mundo. Hoje, ela emprega 100 mil pessoas. Ao contrário de redes como Wal-Mart, essas pessoas não têm contato com os consumidores. As encomendas são empacotadas em imensos galpões espalhados pelos Estados Unidos por anônimos. O site Gawker resolveu abrir um espaço para as pessoas enviarem suas histórias nesses armazéns. Abaixo, algumas delas.

A Amazon é o futuro do varejo nos Estados Unidos. No início desta semana, pedimos aos funcionários invisíveis que recebem as encomendas que você faz que enviem suas histórias.

Como a Amazon não precisa de lojas abertas ao público, a maioria do trabalho real acontece em enormes “centros de atendimento” — grandes armazéns de estoque estrategicamente localizados em todo o país, onde os pedidos chegam e são enviados. Um trabalhador comparou seus afazeres inexpressivos à vida na prisão. No ano passado, Mac McClelland escreveu um artigo esclarecedor sobre os armazéns no site Mother Jones. (Estranhamente, as histórias envolviam o empacotamento de um consolo).

Varejo on-line é o futuro. Ao contrário das grandes lojas tradicionais, os funcionários que empacotam os produtos encomendados on-line estão fora da visão e da mente. É ainda mais importante ouvir suas histórias. Trabalhadores da Amazon parecem não compartilhar o senso coletivo feroz de desespero dos colegas do Wal-Mart. Esta é uma oportunidade de ouvir o que eles têm a dizer.

Um trabalho, não uma carreira

“Eu amei o meu tempo na Amazon. Trabalhei no armazém de Fernley, em Nevada, durante 90 dias na época do Natal. É o trabalho mais difícil e o que eu mais gostei de fazer. Perdi peso, estou na melhor forma dos últimos anos e conheci algumas pessoas fora da minha zona de conforto. Você já se perguntou onde as pessoas com moicanos, tatuagens e piercings no corpo inteiro trabalham? Eu sei! Sim, as ordens são estarrecedoramente chatas e a segurança é uma piada, mas adivinhem???? A Amazon tem de fazer isso para se proteger de chorões que querem uma desculpa para contratar um advogado e ganhar dinheiro. É um trabalho, não uma carreira. Eu era um selecionador de itens. Andava a pé de 8 a 25 quilômetros por dia. Tirei algumas coisas esquisitas das prateleiras. Aprendi muito. As pessoas fazem encomendas permanentes de fraldas e alimentos para animais. Comida, doces, maquiagem, brinquedos, além livros, discos e calendários!”

“Roubo? Sim, há pessoas estúpidas que pensaram que poderiam fugir com material. Elas foram removidas e fichadas. Eu escolhi transformar essa experiência em algo positivo e, por isso, fui contratado novamente para a temporada de Natal. E, no próximo ano, a menos que eu acerte na loteria, vou concorrer a um emprego em outro armazém.”

“Faço parte de um grupo chamado Camperforce. A maioria de nós tem mais de 50 anos. Contratos de curto prazo para que possamos continuar fazendo nossas viagens de RV! Eu amava meu trabalho na Amazon. Eu estava exausto e feliz. Eu recomendo. É um trabalho e não uma carreira!”

Workers are seen in the Amazon.co.uk warehouse in  Milton Keynes, north of London

Jogos da mente

“Eu tenho três principais reclamações. Eles mentem para você quando você chega à porta. Eles definem metas irreais. E as pausas são muito curtas.”

“Eu trabalho no armazém de Chester, em Virginia. Eles pintam essa imagem de um lugar divertido. Que você brinca durante os intervalos e se diverte muito. As únicas brincadeiras que eles fazem com você são os jogos mentais. Isso me leva a minha segunda denúncia, de metas irrealistas. Eles esperam que você trabalhe num ritmo incrível. Eu estava em boa forma quando cheguei lá, mas não estava preparado para os quilômetros de caminhada a cada dia. Meus pés doem, eu tive problemas para dormir, eu tinha muita dor. Meus pés melhoraram, mas o salário não.”

“Outro problema das metas irrealistas é que eles têm esse negócio de pagamento de bônus — se o armazém não comete erros, você recebe bônus no seu salário. É claro que isso nunca acontece. Eles dizem que outros armazéns têm melhores números, mas eles não mostram. Você só tem que acreditar naquilo e entender que o armazém de Chester tem um bando de perdedores idiotas.”

“Intervalos… Eles dizem que você tem duas pausas de 15 minutos e um intervalo de meia hora, mas não existe permissão para sair das instalações no início. Em um dia de 10 horas, você tem permissão para duas pausas de 5 minutos e uma de 20 minutos.”

Trabalho temporário

“Eu trabalhei na Amazon como temporário durante alguns meses em 2012. Foi em um dos vários armazéns que eles têm nas redondezas de Phoenix. Eu trabalhava no turno da noite, que começava às 19h e terminava às 7h, ou sempre que eles mandavam pessoas embora.”

“Fui contratado através de uma agência de trabalho temporário. Eu fiz a minha entrevista e um teste de uso de drogas com um cotonete preso na minha boca. Enquanto estava esperando, passava um vídeo que dizia: ‘Você vai para a escola? Isso é ótimo! Basta dizer-nos o seu horário e podemos trabalhar com isso’. Então, quando fui entrevistado, levei minha agenda escolar e uma senhora zombou: ‘Nós não nos importamos com horários escolares.’ Caramba, tudo bem. Eu entendo se esse é o tipo de trabalho, mas é uma bosta que eles sejam hipócritas.

“Foi muito difícil ficar de pé durante aquele tempo todo, mas não era muito diferente de quando eu trabalhava na loja Target quando adolescente. Eles fazem aqueles exercícios estúpidos de alongamento no início do turno e novamente na hora do almoço, e o chefe grita com todo mundo para voltar do seu descanso e do almoço a tempo, e lembra a todos sobre os erros a evitar.”

“Eu trabalhava no armazém que tinha principalmente grandes artigos e não livros e CDs — utensílios domésticos, ferramentas, brinquedos e outros itens maiores. Eu trabalhei na ‘saída’, que era como eles chamavam o departamento que lida com a embalagem e o transporte. Por algum motivo fui aproveitado na linha de caixas de tamanho grande, que era para as coisas que não se encaixam em nenhuma das nossas caixas padrão. Havia um monte de ferramentas de poda de árvores, pás, escadas e varas de pesca. Eu operava a máquina de caixas personalizadas. Meu trabalho era arrancar o excesso de papelão, jogá-lo fora, dobrar a caixa, colar a tampa, bater um código de barras e colocá-la no escorredor para os empacotadores. Eu fiz isso, provavelmente, mil vezes por noite.

“O almoço durava 30 minutos e você tem duas pausas de 15 minutos. Os 15 minutos contam a partir do momento em que você deixa sua área de trabalho. Poderia levar de 5 a 10 minutos para chegar à área de descanso. Nós não éramos autorizados a trazer telefones celulares e tínhamos de passar por detetores de metal até mesmo para chegar à sala de descanso.”

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