Vacinas: fake news pode virar crime

Projeto que tramita na Câmara prevê multa e prisão para quem espalhar notícias falsas. Leia também: sarampo matou 140 mil pessoas só em 2018; estranha doença do cigarro eletrônico chega ao Brasil

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Por Maíra Mathias e Raquel Torres

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MULTA E CANA

Quem divulgar, propagar e disseminar, por qualquer meio, notícias falsas sobre as vacinas componentes de programas públicos de imunização poderá ser condenado a pagar multa e até a um mês de prisão. É o que propõe o projeto de lei 3.842, apresentado este ano pela deputada federal Alice Portugal (PCdoB-BA) e aprovado na quarta-feira pela Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara.

O texto acrescenta ao Código Penal brasileiro o crime de oposição e omissão à vacinação. As mesmas punições poderão ser aplicadas a responsáveis que se negarem a imunizar menores de idade sem justificativa. “A vida em sociedade exige, certamente, a relativização de direitos por todos, em prol do interesse público, do bem comum, e a vacinação pode ser considerada uma situação paradigma”, disse o relator do texto, o deputado Pedro Westphalen (PP-RS), autor do substitutivo aprovado na Comissão. 

O PL ainda tem um longo caminho pela frente: precisa ainda passar pela Comissão de Constituição e Justiça e depois ir ao plenário da Casa. Daí, finalmente chega ao Senado, onde se não for modificado, pode ser aprovado. Até lá, com certeza suscitará debates sobre a efetividade do punitivismo no combate à desinformação e na promoção da saúde. 

140 MIL MORTES

Falando em vacinação, a OMS divulgou ontem números que mostram a escalada global do sarampo nos últimos anos: em 2018 a doença atingiu 9,7 milhões de pessoas e matou 140 mil – e a maior parte das mortes foi entre crianças menores de cinco anos. Comparando com 2017, houve um aumento de quase 21% nas mortes; desde 2016, o crescimento foi de 55%.

Embora se fale muito no avanço da doença nos EUA e na Europa, onde impera o movimento antivacina, a região mais impactada é, na verdade,a África Subsaariana. E o pior país é a República Democrática do Congo, que, como sabemos, enfrenta também um surto violento de ebola desde meados do ano passado. Lá, mais de cinco mil pessoas morreram com sarampo em 2018 – é mais que o dobro das mortes por ebola nesse surto mais recente.

O diretor-geral da OMS Tedros Ghebreysus disse que “o fato de qualquer criança morrer de uma doença evitável por vacina, como o sarampo, é francamente um ultraje e um fracasso coletivo”. As taxas globais de vacinação contra a doença estão estagnadas há quase uma década. A estimativa é que 86% das crianças do mundo tenham recebido a primeira dose da vacina em 2018, e menos de 70% tenham recebido a segunda. Evidentemente, a média não reflete o todo, e sempre há lugares que ficam muito abaixo dela. Para que surtos sejam prevenidos, a OMS recomenda uma cobertura de no mínimo 95% em cada local.

CHEGOU AQUI

Temos acompanhado o caso da doença pulmonar ligada a cigarros eletrônicos nos Estados Unidos. Pois agora a Sociedade Brasileira de Pneumologia Torácica alerta que três pessoas já tiveram esse diagnóstico no Brasil. A entidade afirma que os três adquiriram o dispositivo eletrônico nos EUA (aqui, a venda é proibida) e usaram THC na vaporização. Apesar da afirmação da SBPT, não houve nenhuma confirmação por parte da Anvisa. Em outubro, a agência pediu que instituições de saúde enviassem alertas quando identificassem problemas do tipo.

O último balanço oficial do governo dos EUA diz que já houve 48 mortes e 2.291 casos.

E um estudo do Inca mostrou que, em 2018, o consumo de cigarros ilegais caiu no país pelo segundo ano consecutivo. Chegou a 39,7 bilhões de unidades em 2016, representando 42,8% do mercado total. Em 2017, houve uma queda e o consumo ficou em 34,9 bilhões de unidades e, finalmente, no ano passado, o número diminuiu mais, chegando a 26,2 bilhões de unidades.

Por outro lado, o consumo de cigarros legais aumentou. Após atingir a marca de 53,1 bilhões de unidades em 2016, o consumo subiu para 55,8 bilhões em 2017 e seguiu a tendência de alta, chegando a 57,2 bilhões de unidades em 2018. O estudo foi publicado na revista científica Tobacco Control.

CONTRA A DESTINAÇÃO DOS ROYALTIES

O governador do Rio de Janeiro Wilson Witzel apresentou uma ação no Supremo Tribunal Federal que pode ter sérias consequências para o SUS e para a educação pública. Ele pede que estados e municípios sejam liberados de destinar as receitas do royalties do petróleo às duas áreas sociais. A lei que determina essa obrigação é de 2013, aprovada logo depois das Jornadas de Junho, e estabelece que, nos contratos celebrados a partir de dezembro de 2012, 75% dos recursos recebidos sejam usados na educação e 25% na saúde.

“O argumento central é o de que os estados e municípios têm autonomia financeira, não cabendo à União – a lei foi aprovada pelo Congresso – interferir. Eles destacam que os royalties servem para ‘compensar os danos e toda sorte de efeitos que a atividade exploratória produz sobre o território desses entes federativos produtores’”, descreve o repórter André de Souza no jornal O Globo.

Witzel pede uma liminar, ou seja, uma decisão provisória que suspenda a obrigatoriedade dos gastos em educação e saúde até o julgamento definitivo da ação pelo plenário do STF. A relatora da ação é a ministra Rosa Weber.

PROVAS OU RETRATAÇÃO

A declaração dada pelo ministro da Educação, Abraham Weintraub, de que as universidades federais teriam “plantações extensivas de maconha” e laboratórios de produção de drogas sintéticas está sendo cobrada na Justiça. Uma ação movida pela Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) pede que Weintraub diga quais são as provas que amparam suas declarações, sobre quem especificamente elas foram dirigidas e quais foram as providências tomadas pelo MEC nesses casos —ou ainda que o ministro se retrate.

E por falar em Cannabis, o repórter Carlos Madeira obteve via Lei de Acesso à Informação o total de recursos já gastos pelo Ministério da Saúde com produtos à base da planta. Entre 2015 e o primeiro semestre deste ano, o governo comprou 5.319 produtos como óleos, líquidos e comprimidos obedecendo decisões judiciais, a um custo total de R$ 2,9 milhões

O NÓ DA COBERTURA

O Instituto Patrícia Galvão publicou um estudo sobre a cobertura midiática de casos de feminicídio e violência sexual. Foram analisadas mais de 1,5 mil notícias sobre homicídios e 478 sobre estupros em 71 portais e sites jornalísticos das cinco regiões do país, todas publicadas nos seis meses seguintes à promulgação da Lei do Feminicídio, ainda em 2015. O resultado mostra que falta muito para que os casos sejam de fato bem relatados e, mesmo que três anos depois possa ter havido algum avanço, a pesquisa segue importante: “Prevaleceram matérias sobre a morte em si, sem informações sobre quem era aquela mulher, se já havia buscado ajuda, recorrido ao Estado para se defender de violências anteriores ou se tinha medida protetiva, entre outras questões que podem apontar falhas nas políticas públicas de enfrentamento à violência contra as mulheres”, diz o texto divulgado pelo Instituto.

Nos casos de estupro, persistem abordagens que culpam a vítima, associando o crime a sensualidade, uso de álcool, drogas ou outros comportamentos “inadequados”. Em relação aos homicídios, a imensa maioria das matérias (1.084 delas), não dizia a motivação para o crime. Quando se mencionava essa motivação, quase sempre ela foi identificada como “fim do relacionamento”, “recusa em voltar”, “ciúme”, “violenta emoção”, “defesa da honra” e coisas do tipo. Outro ponto grave: em 15% das matérias que mostravam imagens da vítima, houve exibição dos corpos, em geral de mulheres negras, sem qualquer tratamento. Quando se trata de mulheres trans e travestis, tudo piora: “Além de serem comuns a exposição do nome de registro (e não do nome social) e imagens de corpos dilacerados ou jogados no chão, é frequente a associação à suspeita de prática criminosa (roubo, furto ou ameaça), não se abordando a discriminação social de gênero, a transfobia ou a possibilidade de um crime de ódio”.

CONSÓRCIO

Foi criado um consórcio internacional para apoiar a pesquisa de novos medicamentos contra doença de Chagas, leishmaniose visceral e malária. A iniciativa é liderada por pesquisadores da Unicamp e da USP e vai ser financiada pela Fapesp e pelas organizações sem fins lucrativos Iniciativa Medicamentos para Doenças Negligenciadas (DNDi) e Medicines for Malaria Venture (MMV).

PARA LER COM CALMA

A última edição dos Cadernos do CEAS traz um dossiê sobre saúde mental; na Ciência e Saúde Coletiva, o tema é ‘A Crise e a Saúde: Implicações para a Política, a Gestão e o Cuidado’.

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