A história de uma farsa

O jornalista responsável por desmascarar a pesquisa fraudulenta que, no fim dos anos 1990, associou uma vacina a autismo.

Crédito: Felipe Barros/ExLibris/Secom-PMI

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Essa e outras notícias aqui, em onze minutos.

17 de setembro de 2018

A HISTÓRIA DE UMA FARSA

Hoje já é bem sabido que a enorme pesquisa que associava o autismo à vacina tríplice viral (que protege contra sarampo, rubéola e caxumba) era mentira. Bom, talvez não seja suficientemente sabido: no movimento antivacina que cresce em especial na Europa e nos EUA, a associação ainda é citada e temida. O fato é que o estudo, publicado em 1998 no periódico The Lanclet pelo médico britânico Andrew Wakefield, é uma das maiores fraudes da história da ciência. E Fabiana Cambricoli, do Estadão, conversou com o jornalista que investigou e começou a denunciar a falsidade do artigo.

Brian Deer, então repórter do Sunday Times, descobriu que Wakefield havia sido contratado por advogados para produzir dados contra a vacina para que eles pudessem ganhar dinheiro processando os fabricantes do produto. Ele começou a escrever sobre isso em 2004 e, a partir daí, foi encontrando manipulações de dados nio estudo e mais conflitos de interesses – como o fato de que o pesquisador tinha registrado a patente de sua própria patente de vacina contra o sarampo. Em 2010, Wakerfield teve seu registro cassado e aLancet revogou a publicação de seu artigo. Oito anos depois, o médico segue insistindo em sua tese e os efeitos da pesquisa fraudulenta perduram.

AGROTÓXICOS E UMA EPIDEMIA DE ABORTOS

Em Uruçuí, no Piauí, tem um aborto espontâneo a cada quatro gestações, e é por causa do glifosato, substância presente no agrotóxico mais usado no Brasil. Os abortos não são o único problema: a intoxicação faz com que 14% dos bebês nasçam abaixo do peso (o dobro da média nacional) e nada menos que 83% das mães tenham o leite contaminado. Os dados são apresentados pela matéria do Intercept a partir do levantamento do sanitarista Inácio Pereira Lima, que investigou as intoxicações nesse município em sua tese de mestrado em saúde da mulher pela Universidade Federal do Piauí.

O QUE QUEREM OS ELEITORES…

A repórter Natália Cancian, da Folha, procurou usuários do SUS para saber suas principais demandas. “Mais médicos”, “mais atenção”, “mais equipamentos” e “menos fila” foram pedidos que se repetiram, escreve. Ela recorda uma pesquisa do Datafolha feita a pedido do CFM em que 55% dos entrevistados avaliaram a saúde no país como ruim ou péssima e só 10% como boa ou excelente, incluindo serviços públicos e privados. Quase 40% estavam naquele momento esperando por algum atendimento no SUS, como consultas, exames ou cirurgias.

… E O QUE PROMETEM OS CANDIDATOS

O mesmo jornal perguntou aos presidenciáveis qual o maior problema na saúde hoje e o que pretendem fazer a respeito. Ciro Gomes (PDT), Jair Bolsonaro (PSL) e Marina Silva (Rede) não responderam.

Haddad (PT) focou no financiamento e disse que prevê ampliar a verba para atenção básica e revogar a Emenda 95, que mantém os gastos da União com saúde congelados até 2036. Para resolver o problema das filas e atender demandas por exames e consultas, pretende criar clínicas de especialidades médicas.

Alckmin (PSDB) citou quatro problemas: financiamento, gestão, desperdício e judicialização. Disse que a  questão financeira vai ser resolvida com “equilíbrio das contas públicas”; para a gestão, defende o Cartão Cidadão para concentrar os dados dos usuários. Contra o desperdício, quer medidas de fiscalização, treinamento e “mudança de cultura”. Para a judicialização, “oferecer aos juízes melhor formação”.

Guilherme Boulos (PSOL) citou a desigualdade como maior problema e, como solução, “a ampliação do direito à saúde pública e gratuita, priorizando grupos e regiões mais carentes e de forma articulada com outras políticas públicas”.

Para Henrique Meirelles (PSDB), o principal problema é o “excesso de demanda do SUS”, que ele pretende solucionar com digitalização e informatização, além da proximidade maior com organizações sociais e entidades privadas.  “Não estamos propondo privatizar o SUS, mas sim ampliar a participação privada na gestão. O SUS é público, e não estatal”, escreveu, afirmando que vai ainda ” reduzir as regulações para a oferta de seguros privados de saúde”, basicamente para ter os tais planos mais baratos e de cobertura limitada.

João Amoêdo (Novo), segue o mesmo caminho. Diz que o problema principal é a dificuldade de acesso e a saída está em parcerias público-privadas, organizações sociais e parcerias com entidades privadas.

Álvaro Dias (Podemos) falou da “falta de organização do sistema” e da necessidade de informatizar a gestão.

MURO

Marina Silva tem sido muito vaga em relação à Emenda 95. Não promete derrubar, mas diz que vai investir em saúde, educação… Em entrevista ao El País, manteve a postura. À pergunta “Você é contra o teto de gastos?”, não diz sim nem não, mas responde “Sou a favor do controle do gasto público, eu farei isso por lei orçamentária”. Questionada se “proporia a queda do teto”… de novo escapa do sim e do não.  “Eu vou controlar gasto público, mas eu vou investir em educação, saúde, segurança pública. Não vou deixar congelada essa segurança, saúde e educação que temos”.

ENTREVISTAS CHATAS

Enquanto isso, os leitores da Folha estão reclamando das sabatinas e entrevistas com candidatos às eleições. Paula Cesarino Costa, ombudsman do jornal (que recebe as críticas e as analisa) conta que vários criticam a “falação” e pouco detalhamento nas propostas, além de perguntas longas por parte dos entrevistadores, com pouco tempo para os candidatos.

Paula lembra que, segundo o Datafolha, a saúde é apontada pelos eleitores como devendo ser a prioridade principal do próximo presidente, seguida por educação e desemprego. “Há uma enormidade de maneiras inteligentes, atraentes e necessárias de a imprensa tratar desses temas. Nem candidatos nem jornalistas parecem preocupados, interessados e preparados para discuti-los. Jornais, revistas, rádios e TVs reportam à exaustão a dramática situação de saúde no dia a dia do noticiário fora do período eleitoral, mas, neste momento de debate de propostas, esquecem de encontrar formas de abordagem que obriguem os candidatos a se posicionar”, escreve. Ela retoma o especial sobre saúde nas eleições lançado pela Folha em agosto, que apontava gargalos do setor. Diz que “a lista seria um ótimo ponto de partida para o jornal fazer um candidato a presidente abordar temas específicos de viva voz e sem limite de tempo”.

FORA DA REALIDADE

Pernambuco foi o epicentro da epidemia de zika em 2015, mas as vítimas do vírus não recebem nenhuma atenção nos programas dos candidatos ao governo do estado, mostra a Folha. Apena o plano de Dani Portela (PSOL) cita o problema, propondo a criação de um centro de reabilitação. As famílias se dizem abandonadas pelo poder público. São centenas de crianças com microcefalia, muitas sem acesso à reabilitação por conta das longas listas del espera.

MULHERES E ELEIÇÕES

Que movimentado foi o fim de semana para mulheres que se uniram virtualmente para organizar os pensamentos e mobilizar ações contra o candidato Jair Bolsonaro (PSL). Depois de juntar mais de dois milhões de integrantes em uma semana, o grupo fechado de Facebook Mulheres Unidas Contra Bolsonaro foi invadido por alguém que expulsou as administradoras e mudou o nome para Mulheres com Bolsonaro. Pra completar, apoiadores e familiares do candidato – inclusive seu filho e deputado estadual, Eduardo – passaram a propagandear o grupo cheio como sinal de que o eleitorado feminino está com Bolsonaro. Eduardo chegou a escrever que o grupo era originalmente favorável ao pai, mas que tinha sido invadido pela “esquerda”. Uma mentira descarada que gerou milhares de reações positivas. O grupo já foi retomado, surgiram outros tantos e a hashtag #EleNão está fortíssima. (A propósito , o quadro de saúde do candidato é estável e ele fez vídeo ao vivo ontem)

E a Mídia Ninja está oferecendo suporte (em atividades como design, assessoria de imprensa, audiovisual e redes sociais) para campanhas de candidatas. A escolha é via edital.

ELAS DOAM MAIS

Há mais mulheres do que homens entre doadores de órgãos. A matéria da BBC traz dados dos EUA (onde 60% dos doadores são mulheres) e diz que, embora não haja números no Brasil, essa é uma tendência observada ao redor do mundo. E a disparidade vem crescendo – e entre quem espera uma doação, ao contrário, os homens são maioria.  A reportagem elenca uma série de razões que podem explicar isso. Provavelmente a principal causa é o fato de as mulheres serem socializadas pelo autossacrifício.

IMPORTANTE RECORTE

Um documentário lançado este mês fala do mal de Alzheimer, mas com um recorte específico pouco explorado: a realidade de pessoas que têm a doença nas periferias brasileiras. O texto da Carta Capital sobre o filme afirma que mesmo os riscos de desenvolver Alzheimer são maiores para quem tem baixa escolaridade, o que ainda é o caso da maior parte dos idosos mais pobres. Mas há outros problemas, como o fato de que nas periferias em geral não há infraestrutura que facilite a mobilidade desses pacientes. E outros, bem graves, como a dificuldade no diagnóstico, já que em alguns lugares do país as pessoas esperam meses – ou até dois anos – pela primeira consulta pelo SUS. Isso, obviamente, atrasa o início do tratamento e em alguns casos impossibilita o recebimento dos medicamentos, cuja entrega pode não ser aprovada caso a doença já esteja em estágio avançado. Quase todos os personagens do documentário são usuários exclusivos do Sistema Único.

CRISE E SUICÍDIO

Durante o mês de prevenção ao suicídio, Carlos Estellita-Lins fala sobre essa questão, que em sua avaliação está, inclusive, relacionada à crise social e econômica pela qual o mundo passa. Ele é pesquisador do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz) e estudioso do tema.  “É importante lembrar que o suicídio é uma morte violenta que está associada a situações violentas, a ambientes de violência e a um desfecho violento. (…) os homens, inseridos em uma cultura violenta e machista, têm uma associação maior com o suicídio, e isso afeta inclusive as pessoas desfavorecidas, oprimidas, em condição social desfavorável. Elas têm menos saúde mental e se encontram em meio a problemas de depressão e ansiedade”.

SEM REGISTRO

A partir do sábado, dia 15, produtos de higiene pessoal, cosméticos e perfumes infantis estão isentos de registro na Anvisa. A Agência diz que isso não vai afetar a segurança e que eses produtos são de “baixo rissco por natureza”.

NADA DISSO

É comum pessoas idosas consumirem aspirinas para evitar ataques cardíacos ou derrames, o que já foi apoiado por alguns estudos. Mas um novo, feito com quase 20 mil pessoas nos EUA e na Austrália, mostrou que não há benefícios para pessoas saudáveis, só para quem já sofreu algum ataque ou derrame. O pior é que, além de não fazer bem, a aspirina fez mal a idosos saudáveis, aumentando o número de grandes hemorragias estomacais.

NO RIO…

A prefeitura de Marcelo Crivella deixou de repassar R$ 19 milhões repassados pela União para 46 clínicas e outras unidades privadas conveniadas ao SUS.

POUCA VACINA

O Tocantins pediu para setembro 25 mil doses de vacina contra meningite para o governo federal, mas só recebeu 13%. Segundo o G1, há reduções na entrega em todo o país por conta de atrasos do fabricante, a Fundação Ezequiel Dias.

SARAMPO E PÓLIO

Rede Globo não veiculou os comerciais da campanha de vacinação porque tinham “estrelas” de outras emissoras, como Xuxa e Galinha Pintadinha. “Um crime”, segundo Lalo Leal Filho, professor aposentado da USP.

A campanha nacional terminou na sexta-feira com 94% das crianças vacinadas. Em alguns lugares que não atingiram a meta de 95% ela vai se estender – no município de São Paulo, vai até dia 29; no Rio, até dia 22.

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