Para onde foi a saúde?

Neste segundo debate entre candidatos à presidência, saúde apareceu menos do que Deus

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Neste segundo debate entre candidatos à Presidência, saúde apareceu menos do que Deus

Por Raquel Torres, do Outra Saúde

18 de agosto de 2018

Terminou ainda há pouco o segundo debate entre candidatos à Presidência, dessa vez promovido pela RedeTV, e a saúde ficou ainda mais de lado do que no primeiro.

Não houve perguntas – nem por parte dos jornalistas, nem da população em geral e nem dos próprios candidatos – sobre suas propostas voltadas especificamente para melhorar a assistência, mas houve menções à Emenda 95 (conhecida como “teto dos gastos”, que congelou os gastos públicos primários em áreas sociais até 2036) e indagações sobre posicionamentos em relação à descriminalização do aborto e das drogas. Desemprego e violência foram muito destacados, embora não como questões relacionadas à de saúde pública.

Foi Ciro Gomes (PDT) quem primeiro trouxe a Emenda 95 à baila quando perguntou a Geraldo Alckmin (PSDB) se ele revogaria o dispositivo, “que proíbe a expansão de investimentos em educação, saúde, moradia, estradas, portos, ou seja, tudo que a população precisa”. Para Ciro, o teto dos gastos é uma lei “imoral” e “impraticável”. Alckmin disse que a Emenda só existe porque “as contas estouraram todas no período do PT”, e defendeu que é preciso reduzir “fortemente” o tamanho do Estado para recuperar os investimentos. Garantiu que em seu governo não faltarão investimentos, porque, sendo o dinheiro apertado, “governar é escolher”: “Vamos priorizar educação básica, saúde e segurança pública”.

Quanto a isso, Guilherme Boulos (PSOL) voltou a dizer que vai fazer um referendo para revogar não só essa Emenda mas todo os “atos criminosos de Temer contra o povo”. E Marina aproveitou uma pergunta sobre corrupção para sugerir que mais dinheiro para áreas como saúde, educação, segurança e infraestrutura vão vir também do combate ao sistema “corruptor e corrupto” que se alimenta desses recursos.

Alckmin quis saber sobre saneamento básico e perguntou quais são as propostas de Álvaro Dias (Podemos) para a área. Este criticou o PT, que usou “recursos do BNDES” para construir “porto em Cuba, hidrelétrica e metrô em Caracas”, em vez de “fazer parcerias público-privadas” para despoluir o Tietê e as baías de Guanabara e de Sepetiba. “Claro que o poder público deve investir. Mas há necessidade de buscar parcerias para que a eficiência dos investimentos proporcione qualidade de vida à população”, declarou.

Jair Bolsonaro (PSC) quis falar com o Cabo Daciolo (Patriota) sobre aborto e drogas,  o que, como era de se esperar, não gerou discussão alguma entre os dois. Depois de alfinetar Marina Silva (Rede) por ela ter defendido um plebiscito sobre aborto “apesar de evangélica”, ele partiu para a pergunta: o Cabo é a favor ou contra a descriminalização do aborto e das drogas”? “Eu sou contra”, respondeu prontamente o candidato, com sua já costumeira fala religiosa dirigida à “nação brasileira”. “A palavra de Deus ensina que antes de você ser gerado no ventre, você já era um escolhido, antes de nascer você já estava separado”.

A violência veio pelo tradicional viés da segurança pública, e a intervenção no Rio de Janeiro  foi lembrada. Boulos defendeu o investimento em inteligência, e não na estratégia “tiro-porrada-bomba”. Frisou que 92% dos homicídios não são investigados e disse que vai enfrentar o crime organizado “de verdade”: “O comando dele dele não está no barraco de nenhuma favela, está mais perto da praça dos Três Poderes do que da favela da Rocinha. Basta ver helicóptero de senador cheio de cocaína que foi pego e ficou por isso mesmo”.

Daciolo, por sua vez, quer valorizar o profissional da segurança pública, com um piso salarial e a “união  do povo civil com o povo militar”. E disse que a intervenção no Rio é uma mentira, porque se fosse verdadeira deveria ter intervenção também na saúde e na educação.

Bolsonaro arranjou um jeito de falar de segurança quando foi perguntado sobre igualdade salarial entre homens e mulheres. Primeiro ele desmentiu o fato de ter defendido que mulheres ganhem menos (mas afirmou que o governo “não pode interferir na iniciativa privada”, disse que para resolver o problema basta seguir a lei e clamou: “não vamos usar as mulheres para nos dividir”). Em seguida, prometeu que as mulheres terão “papel de destaque” no tocante à segurança. Porque são mães. “É a mulher que se preocupa se o filho vai chegar vivo em casa, vamos pegar pesado em segurança para que mães tenham paz quando os filhos por ventura saírem de casa”. E, claro, falou do porte de armas. “Defendo que uma mulher de bem, caso queira, caso seja preparada, tenha a posse de uma arma para se defender se assim o desejar”.

A violência no campo apareceu em pergunta de Marina para Ciro: o que fazer sobre políticas de demarcação de terras indígenas? E Ciro Gomes apontou ninguém menos que sua vice Kátia Abreu – conhecida por seu papel no agronegócio e justamente por ter demonstrado posições controversas quanto aos conflitos por terra – como alguém que “compreende com muita clareza a necessidade de a gente achar o equilíbrio”. Já Marina promete seguir no caminho da valorização da Funai e de fazer as demarcações indenizando os fazendeiros “de acordo com o mercado”.

Perguntada pelo jornalista Mauro Tagliaferri sobre o que fazer para manter os idosos saudáveis – e no mercado de trabalho -, Marina classificou a reforma da previdência como “necessária” e disse que a terceira idade tem que chegar ao seu descanso “não apenas ficando parada”, mas “aproveitando esse período para desenvolver outras atividades”. Para isso, defendeu, é fundamental ter um sistema de saúde que funcione. Meirelles disse que é preciso primeiro ter empregos para que quem “quer trabalhar” possa trabalhar. E também que é preciso ter um “governo competente que tenha condições de investir em saúde” e saneamento.

O candidato ausente

Mais cedo, o Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) decidiu que o Estado deveria garantir a Lula (PT) seus direitos políticos, mas, ao menos em relação ao debate, isso não mudou nada as coisas. O candidato teve novamente seu pedido para participar negado pelo Tribunal Superior Eleitoral.

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