Violação de direitos humanos

Inspeção revela violação de direitos humanos em 28 comunidades terapêuticas

Crédito: PFDC

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Drogas: Inspeção revela problemas em 28 comunidades terapêuticas

Por Cristiane Sampaio, no Brasil de Fato

Uma inspeção realizada em 28 comunidades terapêuticas de diferentes regiões do país identificou que todas as unidades apresentam casos de violação aos direitos humanos. O relatório que reúne os dados da inspeção foi divulgado na tarde desta segunda-feira (18), em Brasília.

Inédito no país, o diagnóstico foi produzido pela Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), órgão do Ministério Público Federal; pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP); e pelo Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura.

As comunidades terapêuticas são unidades que atendem, em sua maioria em regime de internação, usuários de drogas.

As visitas feitas às comunidades tiveram o objetivo de identificar as condutas adotadas pelas unidades. O estudo verificou, entre outras coisas, que 16 dos 28 locais adotam práticas de castigo e punição a internos.

As principais delas são: obrigatoriedade de execução de tarefas repetitivas; aumento da laborterapia; supressão de alimentação; uso de violência física; privação de sono; uso irregular de contenção mecânica (amarras) ou química (medicamentos) dos internos.

“A gente aponta que tais práticas podem ser caracterizadas como tortura ou tratamento cruel, desumano e degradante, no mínimo, segundo a legislação brasileira”, apontou Lúcio Costa, representante do Mecanismo.

De acordo com os organizadores do estudo, as comunidades terapêuticas carecem de pesquisas que possam oferecer um Raio X detalhado das unidades. Até mesmo o número de estabelecimentos existentes no país é desconhecido.

Denúncias

Um estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em 2015 identificou a existência de cerca de 3 mil instituições, mas há indícios de que o total existente possa chegar a 10 mil unidades.

O estudo divulgado nesta segunda tomou como base entidades que já tenham sido alvo de denúncias ou unidades cuja situação fosse de total desconhecimento por parte dos órgãos envolvidos na inspeção.

As visitas foram realizadas em outubro de 2017 e abrangeram unidades de 11 estados (GO, MT, MG, PA, PB, PE, RJ, RN, RO, SC e SP) e do Distrito Federal, contando com a participação de membros do MPF, peritos de prevenção e combate à tortura, psicólogos e outros profissionais da saúde e do sistema de Justiça.

Outro destaque do relatório é o fato de 11 comunidades possuírem internos adolescentes. Um dos casos identificados diz respeito à situação de uma criança de 11 anos que foi internada em Minas Gerais por decisão judicial.

De acordo com a procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) prevê internações apenas em casos excepcionais, mas não em comunidades terapêuticas.

“E a gente tem que imaginar que a internação é resultado de um ato análogo a crime, e só naqueles casos de crimes violentos. Ela é uma medida absolutamente excepcional, de duração limitada  a três anos, mas encontramos jovens nessas comunidades sem prazo pra sair”, destacou.

A inspeção verificou ainda outras violações de direito, como, por exemplo, a violação à liberdade religiosa e sexual dos internos em 16 unidades. Além disso, apenas 10 apresentavam, por exemplo, alvará sanitário. Todas as instituições visitadas recebem recursos públicos.

De acordo com os coordenadores do estudo, os casos mais graves foram alvo de providências imediatas por parte de órgãos de atuação local, como as Defensorias Públicas e os Conselhos Estaduais de Psicologia.

A ideia é que o relatório seja amplamente divulgado para diferentes órgãos e entidades pelo país, para servir de substrato para novas medidas.

Contraponto

O presidente do Conselho Federal de Psicologia, Rogério Giannini, destaca que o órgão faz contrapontos ao modelo de tratamento aplicado pelas comunidades terapêuticas.

Os principais são a adoção de uma política de redução de danos, com diminuição gradual do consumo de drogas, em vez da opção pela abstinência total, adotada nas referidas comunidades; e a defesa da necessidade de convívio social por parte dos usuários, que, nas unidades, ficam em regime de total privação de liberdade.

“Pensar o financiamento tem a ver com pensar qual a política de saúde mental que nós estamos trabalhando. É [pensar] que tipo de politica pública, de cuidado de saúde mental – e especificamente a saúde mental de pessoas que fazem uso de drogas – vai ser financiado”, disse.

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