Assim se resiste à ofensiva conservadora

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Surge em Guarulhos (SP), após ocupação da Câmara Municipal, exemplo inspirador de articulação política entre movimentos de mulheres, negros, secundaristas, artistas, skatistas e comunidade LGBT

Por Camila Sposito | Imagem: João Vitor Reis

Após 11 dias de ocupação da Câmara Municipal em protesto contra a PEC 241, os manifestantes de Guarulhos decidiram desocupá-la nesta segunda-feira (31.10), de modo pacífico, consciente e vitorioso. Pela primeira vez na história da segunda cidade mais populosa de São Paulo, representantes de várias frentes de esquerda unificaram-se em torno de uma pauta comum e enfrentaram o poder institucionalizado pela mídia local e nacional e pelos coronéis da política de sua cidade para fazerem valer a sua voz.

Conforme a avaliação dos ocupantes, o movimento atingiu uma maturidade tal nesta ocupação que precisa seguir para outras formas de atuação. Planejam uma assembleia para os próximos dias, com a possibilidade de criação de um coletivo suprapartidário capaz de atuar em âmbito municipal e federal. Além da luta contra o governo Temer e a PEC 241, está no horizonte acompanhar de perto a atuação do novo prefeito eleito, Gustavo Henric Costa, o Guti (PSB).A maior parte das ocupantes são mulheres, negros e negras e representantes da comunidade LGBT que se conheceram na própria ocupação. Antes militavam atomizados em cursinhos populares, coletivos feministas e ligados à educação, ou mesmo filiados a partidos como PT e PSOL. Havia também anarquistas, artistas, skatistas, militantes do movimento dos secundaristas e do movimento estudantil.

A esquerda em Guarulhos tem se movimentado de modo crescente desde 2013, quando começaram protestos espontâneos pelo passe livre – as jornadas de junho –, passando pela forte reação às reformas estaduais do governo Alckmin, que precarizaram o Ensino Médio, culminando na rejeição ao governo ilegítimo de Temer e seu ataque à educação emancipatória com a PEC 241 e os projetos de “Escola sem Partido”.

Durante a ocupação, a Câmara de paredes azul bebê, acostumada à monotonia de receber sempre os mesmos discursos e sujeitos da elite guarulhense, com mandatos hereditários, encheu-se de repente de toda a população historicamente excluída dos processos de decisão na democracia burguesa pouco representativa. Foram organizadas diversas atividades abertas ao público, aulas ministradas por professores renomados e shows de artistas famosos, que despertaram o interesse da cidade inteira e da mídia nacional, estimulando o debate sobre educação e aglutinando vários anseios de diversas alas progressistas (acesse a página da ocupação e veja o vídeo das atividades).

A reação à ocupação veio primeiramente na forma de difamação da imprensa local e, depois, da imprensa nacional, que divulgou um vídeo dos manifestantes em situações privadas sem qualquer consentimento deles. Mas nem isso foi capaz de esmorecer os ânimos dos ocupantes. O abalo emocional ocorreu apenas no dia 28.10, quando a Guarda Civil Metropolitana os trancou, impedindo-os de sair ou entrar, bem como bloqueou o acesso a mantimentos doados, como forma de pressão psicológica para enfraquecer o movimento.

A legitimidade dos protestos em forma de ocupação tem sido debatida no país inteiro, tanto no âmbito judicial, provocado pelos famigerados mandatos de reintegração de posse, como no legislativo, onde assistimos a secundarista Ana Júlia Ribeiro discursar brilhantemente em defesa da ocupação como instrumento político legítimo de exercício da cidadania. O Tribunal de São Paulo decidiu recentemente que “as ocupações consistem num movimento que questiona políticas públicas adotadas pelo governo, sem o objetivo de conseguir a posse definitiva dos imóveis”, o que torna inócua a principal arma jurídica dos opositores às ocupações.

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