Contra o #primeiroassedio, a #primeiraresposta

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“No dia que ela falou aquilo, desacreditei. A gente fazia natação juntos. Eu apaixonei. Comecei a acompanhar, mas de longe. Ou ela era mais velha ou eu tava ruim da auto estima: nunca rolou nem sombra de nada”

Por Breno Castro Alves | Imagem: Egon Schiele

Uma amiga me pediu para focar mais na história da Cagada, que foi a ‪#‎primeiraresposta‬ que vi na vida. Vou recontar ela aqui.

Linda, loira dozolho claro, nadadora forte, esguia. Ela deve estar viva e deve chamar Alicia, ou alguma outra variação de Alice. Um dia a molecada tava jogando três dentro três fora (que é futebol e não suruba) e ela passou no meio. O jogo parou, todo mundo parou e ficou olhando, ninguém mexeu (dessa vez..) mas rolou uma tonelada de tensão sexual no ar, que ela destruiu ao virar e perguntar bem alto:

– Que foi, tô cagada?

Já era. A Cagada nunca mais teve outro nome, entre a molecada. Mas ela não sabia, era da outra rua, duvido que alguém chegou pra ela e falou isso. Ela botava uma banca assim, era forte. No dia que ela falou aquilo eu desacreditei. A gente fazia natação juntos. Eu apaixonei. Comecei a acompanhar, a olhar muito mais pra ela, mas de longe. Ou ela era mais velha ou eu tava ruim da auto estima, então nunca rolou nem sombra de nada.

Mas aquele grito na rua, caralho, digo, buceta, aquela foi a #primeiraresposta que eu vi. Mexeu com a minha cabeça e algum tempo depois desse dia eu parei completamente com o fiu fiu, mais uns dois anos e eu já estava repreendendo meus colegas – sem qualquer sucesso. (normal, alguns anos depois, em outro grupo de amigos eu seria o democrata filho da puta, dito como ofensa, ou o sem terra. normal, adolescência. uaréva.)

Todo modo, a história da Cagada me mudou. É muito forte esse momento em que uma mina se levanta e articula o “quer saber? Foda-se que você é mais forte e pode ter disposição pra me encher de porrada, machistas não passarão!”, e manda à merda o babaca que babaquizou em cima dela.

Tem poesia, aí, também. O ‪#‎primeiroassedio‬ é uma catarse foderosa, lavação coletiva de alma, tem que escancarar, ventilar, mesmo, pra curar junto. É ferida social.

A #primeiraresposta é quando uma mulher encontra força pra acabar com o fiufiu. E se isso for profundo, e genuíno, e ela sobreviver, vai seguir acabando, para sempre, com o assédio contra si e contra a mulherada ao redor.

Sério, vocês são lindas. Esfrega na cara da sociedade as merdas. Quero saber como vocês se levantaram, também. Machistas não passarão.

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3 comentários para "Contra o #primeiroassedio, a #primeiraresposta"

  1. Fagner B. Lima disse:

    Péssimo. Supor que a “primeira resposta” muda a mentalidade de todo e qualquer homem não beira somente ao delírio, como também demonstra irresponsabilidade e desconhecimento sobre comportamento masculino e o assédio que as mulheres sofrem. Me desculpa, mas não é porque “funcionou” com você, que irá “funcionar” com todo mundo. Por favor, menos emoção e mais noção dos riscos. Você tá incentivando uma maneira de lidar com as agressões que pode trazer consequências mais graves para uma parcela de mulheres.
    Acho que deveria ser mais do que óbvio que não é toda mulher que tem a sorte de lidar com uma molecada tosca que fica sem reação na “primeira resposta” que recebe — se é que realmente foi como descrito, afinal não li nada sobre a mudança de mentalidade dos amiguinhos citados — e nem que todo homem irá abaixar a cabeça ou o tom de voz só porque ouviu resposta. Pelo contrário, muitos homens irão insistir, como a gente pode saber através de amigas, de pessoas próximas num geral ou através de relatos nas redes sociais e notícias de jornais; muitos homens irão se impor ainda mais, afim de “colocar as mulheres em seus devidos lugares”.
    Enfim, cuidado com esse tipo de sugestão. Pode até funcionar em alguns casos, mas não é a “receita ideal” pra todo e qualquer assédio. Seria “maravilhoso”, se o fosse, pois não teríamos mais com o que nos preocupar, além de aconselharmos as mulheres a responder e nada mais. Infelizmente, não é assim. E a responsabilidade pelo fim do assédio não cabe somente às mulheres, mas principalmente aos homens, que são os agressores. Quem deve impedir algo aqui somos nós mesmos: impedir que nos comportemos de maneira tão cretina e grotesca, independente de ouvir ou não qualquer resposta.

  2. Pedro Botton disse:

    Cara, delicado isso que você tá contando e o tom do texto beira o irresponsável: você não pode incentivar as mulheres a responder individualmente a essas agressões diárias, nessa anedota sua era um bando de muleque chutando bola, mas a menina lê isso e se sente no poder (ou, pior, no dever) de responder pro “gostosa” vindo da obra e na sexta-feira é estuprada porque o cara ficou puto com a empáfia dela. Resolver uma injustiça dessa por conta própria não é a saída e incentivar isso, muito menos. Terminar o texto chamando as minas de “lindas” também é o fim, como se essa fosse a maior qualidade que uma mulher poderia ter.

  3. marise vieira eiras disse:

    Antes de acabar com o fiufiu a gente precisa fazer as pessoas entenderem que isso não é bobagem e que tem sim muitas vezes uma violência embutida que machuca. Quando vi meu marido criticar uma mulher que andava no caminho prá casa sozinha de madrugada, porque ela estava “pedindo problemas”, eu me lembrei de como costumava andar sozinha quando jovem , a hora que me desse na telha. E porque a gente precisa estar ou abrigada dentro de casa ou ter um homem por companhia? Ele não falou por mal, apenas expressou o senso comum, mas que não deveria ser assim.

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