Lawrence Lessig: surpresa na disputa pela Casa Branca

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Lessig e o Creative Commons: mudanças tecnológicas das últimas décadas – em especial a informática – tornaram possível sociedade de compartilhamento. Mas capitalismo quer bloqueá-la a qualquer custo.

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Intelectual e ativista famoso por defender livre circulação do conhecimento anuncia (anti-)candidatura. Sua primeira medida: um plebiscito para iniciar Reforma Política

Quanto mais se aprofunda a crise da velha democracia, mais parecem surgir novidades políticas – inclusive à esquerda do espectro tradicional dos partidos. Uma delas despontou ontem (11/8), nos Estados Unidos – e talvez dialogue com o Brasil. Lawrence Lessig, professor de Dirieto da Universidade de Universidade de Harvard e criador do movimento Creative Commons anunciou planos de lançar uma (anti-)candidatura à Casa Branca, pelo Partido Democrata. Não espera que a máquina partidária o escolha. Quer aproveitar o debate nacional provocado pelas eleições presidenciais de novembro de 2016 para propor uma vasta Reforma Política, que refunde o país e, em particular, proíba as corporações empresariais de condicionar a democracia.

A disposição de questionar o atual sistema político está presente no DNA da iniciativa de Lessig. Num artigo publicado ontem no site Huffington Post e numa destacada entrevista ao Washington Post, ele comunicou que está recorrendo ao próprio público, para financiar a (anti-)candidatura. Por meio de crowdfunding, pretende arrecadar 1 milhão de dólares até a primeira segunda-feira de setembro (7/9), quando se comemora o Dia do Trabalho nos EUA. O apelo inspira-se em ação muito semelhante adotada, em 2014, para criação do Podemos, na Espanha – e Lessig parece ter começado bem. Pouco mais de 24 horas depois de apelar aos eleitores, ele já obteve quase 13% do que almeja.

A plataforma do (anti-) candidato é ainda mais instigante. Para ressaltar a “desesperada necessidade” de Reforma Política, Lessig quer apresentar-se como presidente de um único ato: convocar um plebiscito para rever e transformar as instituições que regem a “democracia”. Conhecido por seus pontos de vista claramente à esquerda, ele explica, na entrevista: “não sou monotemático. Tudo é importante para mim: do poder de Wall Street à mudança climática e ao sistema financeiro”. No entanto, ressalva: “Nenhuma da promessa de mudança pode ser cumpridas no interior das instituições atuais”.

Hoje com 54 anos, Lessig construiu uma rica trajetória de lutas, cujo foco central é apontar o que se poderia chamar de obsolescência do capitalismo. Ele frisa que as mudanças tecnológicas das últimas décadas – em especial a informática – tornaram possível uma sociedade em que o compartilhamento é cada vez mais possível. Mas o sistema jurídico e político permanece voltado para as relações sociais anteriores e funciona como uma enorme barreira ao avanço.

Advogado e acadêmico, Lessig voltou-se para a busca de saídas legais para o impasse. Uma de suas contribuições mais notáveis é o Creative Commons, um conjunto de normas sobre direitos autorais que abre caminho para a livre circulação de informações, ao invés de aferrar-se ao velho conceito de de “propriedade intelectual”, ou “copyright”.

A partir de 2007, este percurso sofreu uma guinada importante. Lessig anunciou que deixaria de se concentrar na luta contra o “copyright”. Havia compreendido que uma verdadeira mudança não pode se dar apenas no campo legal: há interesses poderosos agindo pela manutenção das atuais lógicas jurídicas. O ponto central, notou ele, é a presença do dinheiro das empresas na política. Esta é, fez questão de dizer, a causa essencial do que alguns chamam ingenuamente de “corrupção”. Contra ela, propôs uma Lei de Igualdade Cidadã. Se adotada, proibiria as corporações de pagarem a partidos ou candidatos; e instituiria um sistema misto, em que o financiamento da atividade política seria feito por um misto de doações individuais de cidadãos, com valor limitado, e fundos públicos proporcionais.

Lessig vê a (anti-)candidatura como meio de dar mais visibilidade a estas ideias. No artigo e entrevista publicados ontem, ele dialoga abertamente com outros políticos à esquerda – em especial, Bernie Sanders, pré-candidato pelo Partido Democrata (contra Hillary Clinton) apoiado por Noam Chomsky e a senadora Elizabeth Warren. Mas sustenta: nenhuma das “reformas maravilhosas” propostas por eles será possível até a mudança do sistema político. E, baseado em pesquisas, lembra: mesmo nos EUA, 82% da população consideram as instituições atuais “uma fraude”…

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