Comunicação e Sustentabilidade: em busca de caminhos

Foto: Gutierrez de Jesus Silva

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Oficina compartilha e debate, em São Paulo, experiências coletivas em favor de lutas socioambientais e o papel da mídia alternativa nesse processo

Por Bruna Bernacchio

Durante dois dias intensos, jovens de organizações e movimentos com variadas cores e formas encontraram-se para debater, trocar e produzir em torno dos temas juventude, sustentabilidade e comunicação. Dinâmicas lúdicas, atividades práticas e falas de convidados mais experientes, expondo suas vivências e opiniões, impulsionam um mergulho nesse tema tão delicado, que com devido cuidado deve ser tratado pela mídia e a sociedade em geral.

Organizada e financiada pela fundação alemã Friedrich Ebert Stiftung – FES, a oficina “Entendendo e comunicando a sustentabilidade a partir da sua área de atuação” aconteceu no espaço dividido entre a redação de Outras Palavras e a Viração Educomunicação, em São Paulo. Além das duas organizações, participaram representantes da Revista Fórum, Circuito Fora do Eixo, dos veículos de comunicação Rede Brasil Atual e Jornal ABC, além de gente da Marcha Mundial das Mulheres, Coletivo Homens Feministas, Rejuma – Rede da Juventude pelo Meio Ambiente e Sustentabilidade, CEERT – Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades, TVT – TV dos Trabalhadores, AMARC – Associação Mundial das Rádios Comunitárias e CUT.

Somente em um grupo de cerca de quinze jovens, uma infinita multiplicidade de origens, opiniões e lutas, cada uma importante em sua existência e prioridade – como deve ser, por um simples reflexo da diversidade social e cultural da humanidade -, já foi um desafio encontrar uma única visão de sustentabilidade. Mas não impossível. Eliminando-se os egos, o combate de interesses individuais, o conjunto encontra pontos de confluência, foco.

Diante de tal contexto, como comunicadores, exercitamos a análise e o aprofundamento dos temas socioambientais a partir da diversas abordagens, discursos. A importância do desconfiar, do saber questionar e, principalmente, mantendo a interrelação de todas áreas e aspectos da questão, focando na sua especificidade de atuação, mas enxergando-a sempre de maneira mais ampla. Entendendo que o social e o ambiental são a mesma coisa, e que o jornalismo é só uma das ferramentas de atuação.

Porque são mesmo essas pequenas causas específicas as mais eficientes, quando colocadas como demanda através de pressão social, organizada ou não: acontecem mais facilmente e também transformam. Mas é importante que os pontos e traços em comuns fiquem cada vez mais claros. Para que também, quando possível e necessário, consigamos caminhar juntos, em número cada vez maior. Para que no momento em que todos os movimentos se encontrem num mesmo Aterro do Flamengo, para falar sobre Desenvolvimento Sustentável, as vozes não se abafem, mas gritem num só tom.

E é aí onde nós ainda temos muito o que aprender. Pois para provocar uma mudança global, planetária, visível e significativa, é necessário que haja uma pauta comum, capaz de influenciar até o processo diplomático entre os países, o jogo de interesses dos poderosos. E mesmo em meio aos povos e suas disputas, essa pauta comum ficou clara na Rio+20, e permanece: é a demanda inerente de um novo modelo econômico e político. O pós-capitalismo.

Sim, a realidade atual é outra. E pensando no agora, com suas muitas limitações, por mais que não acreditemos no sistema multilateral – como se expressou na Cúpula dos  Povos -, não podemos nos afastar e se recusar ao diálogo. Caso contrário, os interessados envolvidos tomarão conta e decidirão por nós. Torna-se essencial, portanto, que nós, sociedade e mídia, acompanhemos o processo da Cop 18, os 17 encaminhamentos do futuro que queremos levantados pela ONU após a Rio+20, que cobremos as autoridades públicas, que fiquemos próximos do precário e desconhecido espaço de participação popular da ONU.

“A ONU não tem a menor noção do que é trabalhar em rede”, diz Aron Belinky, da Vitae Civilis. Mas a sociedade não depende dela para agir. Sem excluir esse processo das grande conferências e tratados, pode ir também para outra perspectiva e âmbito – para o micro, o regional, o local. Mas sempre mantendo o olhar macro, global, transdisciplinar. Isso é necessário para qualquer ação, campanha, reportagem ou produção. No Brasil, este ano foi decisivo para possibilitar isso. As ondas se formaram, o mar está agitado e os barcos chegando em cada vez mais número.

A Lei de Acesso à Informação está começando a obrigar os órgãos públicos a disponibilizares dados sobre suas ações, seus resultados e suas estratégias. A movimentação ainda é muito embrionária, pois eles ainda resistem para realmente serem transparente e facilitadores. Mas as pessoas cada vez mais descobrem trilhas e atalhos para se chegar ao destino desejado. Ministério Público do Trabalho, Ministério Público Federal, IBGE, entre outros, já aparecem como boas fontes, disposta a de verdade se abrir, construir junto.

E aí, com uma rede cada vez maior, a tendência é que os grupos sociais aprendam juntos, transcendendo profissiões, divisões sociais e culturais, tornam-se naturais e contínuos comunicadores, desenvolvendo sua capacidade recente de ler esses dados, analizá-los, cruzá-los, para assim criticar, sugerir mudanças e agir. É possível citar centenas de experiências.

Os hackers ratos da Casa de Cultura Digital, por exemplo, com seus mapeamentos dos incêndios das favelas em São Paulo e do circuito alternativo de cultura urbana da cidade. Ou os brilhantes jornalistas Daniel Satini e Verena Glass, da Repórter Brasil, que na oficina contaram suas investigações,  mapeamentos e denúncias de cadeias produtivas – do trabalho escravo, da soja, da carne, do agrocombustível, e outras produções rurais. Também o Hackday do Código Florestal, realizado de forma colaborativa por diversas organizações e indivíduos, que em 48 horas levantaram milhares de informações, e devem publicar os resultados no site do movimento #florestafazadiferença. Ou o Conexões Sustentáveis, que engloba e relaciona diversos temas, entre muitas outras iniciativas de cruzamento e sistematização de dados.

Mas há muita coisa para ser investigada ainda. É na rede, nos encontros, no coletivo, que seguimos na caminhada. Procurando torná-la cada vez mais firme, efetiva. No debate, ideias perigosas fervem: podemos, por exemplo, ocupar a plataforma oficial das grandes conferências, numa tentativa de mais diretamente influenciar? E se criássemos núcleos de inteligência coletiva para que os movimentos trabalharem em grandes temas juntos? A hora de agir é agora e o debate eterno, constante. O desafio é manter a visão ampliada, de um Planeta Terra, um Universo, que supera qualquer classificação e diferença, mas ao mesmo tempo está totalmente interligado ao pequeno território, à rua pública, aos espaços, ao indíviduo e cada uma de suas células.

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